Sunday, January 28, 2007

*com voz de mordomo de casa antiga em filme de terror dos anos 50*

Caros leitores e leitoras, boa noite. Em meio ao fim de mais este fim de semana, aceitem as saudações de Louco.

diante de vocês, e abaixo deste post, vem a parte final deste capítulo, Cemitério de Aviões. Espero que os eventos demonstrados no geral tenham vindo ao seu contento, e que o encerramento seja igualmente do seu agrado; tal coisa muito me honraria.

(e agora chega de ficar embaçando, que tá todo mundo com calor e sem paci~encia)

amplexos do Louco ^^

(...)

No final, os homens ficaram no imenso B-17. Maddock fizera pressão até o fim e mantivera sua atitude, e Zero acabara se resolvendo a ficar numa torre de tiro abaixo da fuselagem enquanto Daniel e Laírton ficariam com o resto do avião. Eles ainda insistiram para que Zero pensasse melhor; a torre parecia absurdamente apertada para que alguém dormisse confortavelmente, mas o mecânico fora irredutível, exatamente como uma criança birrenta.

_ Tá tudo bem, Daniel. Se eu acordar com a coluna torta, com o braço no lugar de uma costela ou coisa parecida, eu vou culpar o Maddock por não me deixar ficar na cabine. Você é o pior anfitrião de todos, Mad, nem deixa suas visitas à vontade na hora de escolher aposento...!

_ Culpa minha o caramba – Maddock retrucou lá de dentro, apenas sua cabeça aparecendo na porta do piloto – Tá aí a fuselagem inteira e você tá que nem um bebezão fazendo manha e indo sozinho pra torre. É legal de visitar, sim, mas se ficar torto de dormir nela, o problema é seu. E chega de lamúria, que amanhã começa logo. Afrouxou um pouco as juntas dos ombros e das coxas, igual eu falei?

_ Lógico que afrouxei – Zero resmungou – Pensa que eu sou um idiota ou o quê?

_ Era o ‘o quê’ mesmo que eu tinha pensado – Maddock riu com ar maldoso – Vai dormir então, pé no saco.

_ Vai se lascar, pé no saco é você...!

Daniel cobriu os olhos, sentindo que aquela discussão ia demorar enquanto Laírton parecia já ter conseguido pegar no sono, apesar de todo o barulho. E de repente, achou que poderia ter mais sorte dormindo do lado de fora do avião.

“É incrível o quanto eles fazem barulho; parecem irmãos verdadeiros! E, Zero nunca deixa de me surpreender. Agora, depois de tanto tempo de viagem juntos, acho que consigo perceber que ele está triste apesar de tudo... mas age como se nada estivesse errado, brincando e brigando com o velho amigo. Maddock, também, é curioso; obviamente entendeu tudo o que se passou sem que tivéssemos que lhe dizer... e está jogando o jogo de Zero. À altura”

Daniel sacudiu a cabeça, tentando clarear os pensamentos. Pensamentos confusos o levavam de dúvida em dúvida, e não estava conseguindo relaxar o bastante para pegar no sono. Se realmente pretendia descansar, era melhor que o fizesse logo.

A noite já ia avançada quando aquele que não dormira alcançou a estação de parada sob a casa de Hermes Maddock. Fora silencioso o bastante para passar despercebido até então, e olhou ao redor. O cheiro de pó e de coisa antiga permeava tudo à sua volta, e felizmente, estava afastado o bastante do topo; não iriam ouvir nada do que ele pretendia fazer até que fosse tarde demais para impedir. Talvez o dono do local, caso estivesse em sua casa... mas, como estava dormindo num dos aviões lá fora, não daria qualquer trabalho.

Ele se aproximou do Velocípede, que Mad deixara voltado no rumo da Cidade Sucata novamente. Não deveria ser necessário, talvez o caminho até o porão de Dirceu nem existisse mais... mas Maddock sempre fizera aquilo. Talvez ele até tivesse voltado o Velocípede para lá por instinto, sem perceber...

_ Demorou muito para chegar.

Zero se voltou por reflexo, a mão detendo-se sobre sua Quatro Tiros enquanto Christabel o observava, saindo devagar do canto onde se ocultara. E a surpresa dele, diferente da ocasião em Tria, parecia trazer mais aborrecimento do que diversão.

_ Gah, Christie...? Você não devia tá dormindo?

_ E você?

Zero praguejou em pensamento. Não estava com paciência ou tempo para discutir, e ao mesmo tempo sabia que não se livraria dela. Não com facilidade.

_ Isso é coisa minha. Você não tem nada a ver.

Christabel estava caminhando devagar na direção dele, os olhos com um brilho estranho que ele não reconhecia. Havia algo da velha superioridade dela, mas ao mesmo tempo... algo totalmente contraditório. Algo que ele não estava com condições ou paciência de analisar naquele momento.

_ V-você... me ouviu? Tô falando que você tem que ficar de fora, isso é problema meu! Não é seguro nem sensato você sair daqui agora...

_ Quer falar de sensatez? – ela perguntou, tranquila, ainda se aproximando – Está planejando voltar. Nada sensato.

_ É o meu pai, Christabel! – Zero esbravejou, nem assim conseguindo perturbá-la – Se tiver a menor chance... Uma mínima chance que seja... Ele pode estar vivo, ainda!

Os olhos cinzentos de Christabel pareciam reluzir na penumbra, e por alterado que estivesse, Zero continuava achando que eles eram bonitos. À meia luz do porão de Mad, onde pareciam brilhar no escuro naturalmente, mais bonitos ainda. Belos e tristes, enquanto ela movia a cabeça numa negativa silenciosa.

Zero contraiu o rosto, como se ela tivesse ameaçado bater nele com alguma coisa. Estava perdendo tempo; o pai nunca o deixaria esperando, e não estava certo fazer isso com ele. Deu bruscamente as costas aos olhos tristes de Christabel e encaminhou-se para o Velocípede...

_ Zero.

Ele congelou onde estava. Christabel o chamara pelo nome. Voltou-se, e a viu baixar sua guarda de propósito e estender as mãos para ele. Os olhos dela, sua voz, todo o seu ser... Tudo nela pedia sua atenção. Era a primeira vez, talvez, na vida inteira dela em que Christabel abria seu coração daquela maneira.

Não o estava detendo com força. Não precisava. Ele agora tinha uma escolha; podia ir embora e deixá-la. Mas, isso valeria a pena?

Devagar, quase estudando os próprios movimentos, Zero se voltou para ela. E mesmo o discreto sorriso no rosto de Christabel parecia servir para confirmar que fizera a escolha certa. Um pouco hesitante, ele estendeu os braços para ela.

Christabel avançou sem dizer palavra, deixando-se estar no abraço dele, e enquanto deitou sua cabeça no ombro de Zero, sentiu seu coração em paz. E também ficou grata por poder esconder o rosto, que sentia estar em chamas.

E ele sorriu, feliz e triste ao mesmo tempo. Que hora ela tinha escolhido...! E não tinha como não reconhecer, ela soubera se expressar. Não podia pensar em nada mais que fosse mantê-lo ali.

_ Qualquer dia, Christie, você precisa me ensinar isso. Como consegue dizer tanto falando tão pouco?

Ela sorriu, o rosto ainda escondido no ombro dele.

_ Não aprenderia. Você fala demais.

Sunday, January 21, 2007

Olá gente de domingo! Sob um céu escuro e prometendo chuva, saudações do autor Louco!

Pois é, continuemos. Folgo em dizer que a crise passou, que a história tá rendendo de novo e as coisas estão se encaminhando. Logo, vamos que vamos com a parte da semana!

(...)


Melissa abraçou Zero com força, sentida e ainda assim sem conseguir entender bem. Parecia que seu amigo para sempre conseguiria surpreendê-la; por mais que estivesse triste por perder seu professor mais velho, Zero perdera o pai. Como era possível que não conseguisse se expressar como queria...?

_ Não esquenta, menina, isso também tem jeito. E, viu, dava pra a rapaziada aí me ajudar?

Maddock vinha pelas escadas quase sem enxergar, descendo degrau por degrau muito devagar enquanto várias estruturas metálicas que lembrariam armaduras, se não fossem apenas aros de metal com telas de aparência frágil entre elas, pareciam encobrir seu rosto. E Daniel e Laírton foram até ele, que continuou a explicar quando Melissa ergueu seus olhos.

_ Dizem que quando você sente uma dor muito forte, o corpo não registra pra evitar o sofrimento. De acordo com um especialista que eu conheço, o mesmo parece que vale pra dor psicológica. É uma questão de dar um tempo.

_ Quem diria uma coisa dessas? – Freya olhou para Maddock, ainda cambaleando rumo ao térreo, e ele deu de ombros.

_ Seu Dirceu. Quando meu pai morreu.

Todos ficaram em silêncio, olhando com um novo respeito para o recém-chegado, que parecia totalmente indiferente a todos, mais preocupado em livrar-se do excesso de carga. E ele largou os exoesqueletos sobre uma mesa, derrubando metade no chão, comentando casualmente:

_ A propósito, deu pra ver que tá escurecendo. E isso aqui é casa de homem, e solteiro. Uma casa grandona, com espaço pra todo mundo dormir – ele acrescentou depressa, acenando – mas mesmo assim, acho que pode ser mais legal pra as moças ficarem à vontade se a gente for dormir nos aviões, homarada. Tudo bem?

_ ‘Aviões’...? – Daniel não compreendeu, e Laírton arregalou os olhos.

_ V-você tem... aviões por aqui?! Como é possível...?

_ Ué, isso é um cemitério, eu não disse? – Maddock deu de ombros, sorrindo de novo – Não é pra me gabar, Irmão, mas tem uma variedade muito legal aqui. Nenhum voa, infelizmente, mas tem vários modelos antigos espalhados pra tudo que é lado no pátio lá fora; acho que consigo arrumar lugar pra vocês num velho B-17 que tem lá... ah, mas a cabine é minha, hein?

_ Vai se ferrar, Mad, nós somos visita! – Zero retrucou, parecendo uma criança birrenta – Eu quero dormir na cabine hoje!

_ Você vai dormir onde eu disser pra dormir, e achar bom ainda por cima! – Maddock estapeou a fronte de Zero novamente sem qualquer cerimônia, medindo e ajustando o que parecia um braço de armadura entre dois anéis metálicos – E, aqui; acho que nem que você comece a dançar o frevo enquanto dorme vai conseguir zoar a ossada depois que eu te encaixar essa braçadeira...

Christabel se mantivera olhando para o desconhecido Maddock. Ao chegar ali a impressão que o dono do lugar lhe passara fora a de alguém estabanado e intempestivo, de certa forma muito semelhante ao próprio Zero. No entanto, ele também já passara pelo que o amigo devia estar passando e o estava respeitando e distraindo os outros ao mesmo tempo para evitar comentários. Assim sendo, ela suspirou com alguma resignação, poderia suportar aquele festival de bobagens por mais algum tempo.

Em outra parte, Kayla retornara à caverna onde estivera se recuperando aos cuidados de Ahl-Tur pouco antes da investida dos dois à Cidade Sucata. Conseguira deixar aquele lugar com alguma dificuldade, depois de resgatar seu mestre do subterrâneo, mas havia muito pouco tempo. Teria que ser rápida.

Ainda estava em batalha com os humanos de armadura quando uma nova explosão se fizera no subsolo, no mesmo lugar onde até então pudera pressentir a presença de Tur. Tão depressa quanto pôde, aproveitando-se da desordem causada pelo novo tremor e o desabamento de mais um trecho da rua, Kayla lançou-se pela mesma abertura por onde Tur caíra antes.

Estava exausta pelo poder utilizado e mal-recuperado, ainda enfraquecida de quando Sari lhe drenara o espírito, e sua luta contra os Dragões não a deixara ilesa. No entanto, ainda era uma Arcana; suas forças enfraquecidas ainda eram mais do que suficientes para afastar os escombros do caminho até encontrar Ahl-Tur, tombado e inconsciente sob um pedaço particularmente grande de laje da rua acima. E ela percebeu que partes do corpo dele tinham sido destruídas, vítimas da explosão ocorrida próxima demais a ele. Dirceu atirara nos tubos extras de propelente, e o gás comprimido era inflamável. O velho escavador sabia, como o filho, que munição comum de suas pistolas dificilmente faria qualquer dano em inimigos tão perigosos, e fizera de tudo em seu alcance para ganhar tempo para Zero e os amigos.

Seus esforços foram recompensados. Mais ainda, Kayla pudera notar com preocupação, o corpo espírito de seu mestre estava desaparecendo devagar. Não podia se manter consciente, ou evitar a dissipação. Logicamente, também não conseguia restaurar os danos pesados sofridos por seu corpo físico, e a destruição de um estava apressando a do outro.

“Maldição... Lorde Tur estava certo; não estávamos pensando nos humanos com o devido respeito. E agora nos encontramos em tal situação...!”

A única explicação para a debilidade do espírito de seu mestre era o vapor que tinham inalado quando da destruição do veículo do defensor de Christabel. Da mesma forma que a barreira de magia em Melk, o vapor de Dragão de Fogo parecia ter afetado a eles como uma espécie de veneno sutil; inofensivo para seus corpos físicos, talvez, mas parecia estar interferindo na junção do físico com o espírito. Ela se recuperara graças aos esforços de Tur, mas fora uma recuperação lenta. Sem auxílio agora, ele morreria. Havia poucas opções diante dela, Kayla sabia, e nenhuma era de seu agrado.

“Mas não tenho qualquer alternativa. Se não fizer nada, Tur morrerá. Se fizer, ambos teremos que hibernar enquanto nos purificamos. E... eu devo ajudá-lo a se recompor, antes de começar a tratar de mim mesma. Vai atrasar nossa busca... Nosso criador não vai ficar satisfeito, mas não
há escolha”

O tronco do corpo físico de Ahl-Tur fora separado da bacia e pernas pelo efeito da explosão, assim como seu braço esquerdo. Ela podia ver a chama de sua essência fraquejando como as chamas de uma fogueira esquecida na noite. Era preciso que reavivasse a chama, e pretendia fazê-lo... mas por alguma razão que não saberia definir, hesitou antes de começar. Se fosse uma humana, talvez ficasse corada ou algo semelhante. Como não era, teve que afastar o que parecia um nó em sua garganta, tornando sua respiração mais acelerada, antes de unir seus lábios aos lábios inertes de Tur e soprar sua essência gentilmente para dentro dele. Que o poder de sua vida, reduzido mas ainda forte, fosse o bastante para despertar seu líder em breve.

“E que tenhamos tempo para localizar Christabel e entregá-la a nosso mestre até então”

Conforme Maddock dissera, não havia um número de quartos que fosse conveniente para tantos visitantes, mas ele tinha uma habitação interessante, e os quartos de hóspedes estavam à altura na opinião de todos. O próprio Maddock e mais Laírton, Daniel e Zero deveriam dormir na carcaça de um antigo bombardeiro B-17 no imenso pátio do Cemitério de Aviões, enquanto as moças dividiriam a casa como lhes parecesse melhor.

_ Vão ter que me desculpar, mas eu vou levar os cobertores mais pesados pra fora – Maddock disse às que ficariam com a casa – Não tenho muitos, e de noite pode ficar meio frio pra quem tá dormindo dentro dos aviões.

_ Como sabe disso? – Melissa perguntou, meio que já sabendo a resposta – Não vai me dizer que você...

_ Ué, por quê não? – deu de ombros – De vez em quando, eu gosto de imaginar como é que aqueles caras que voavam se sentiam dentro dos aviões.

_ Não acho que algum deles dormia enquanto estava voando – Freya retrucou com ar vazio. E Maddock sorriu mais amplamente.

_ Também acho que não, Tata. Mas deviam ter a maior vontade! Eu teria no lugar deles.

_ Já disse pra parar de me chamar de Tata!

_ Opa, é mesmo Tata – ela pareceu fumegar enquanto ele sorria – Mas você não é uma deusa viking, então também não posso chamar de Freya. Será que tem algum outro nome que você prefira?

Freya não pareceu nada satisfeita e tampouco respondeu, e Zero saiu empurrando Maddock para fora com pouca cerimônia.

_ Anda, Mad, chega de ficar chateando a Tata. Guarda um pouco pra amanhã, pelo menos. Tá todo mundo cansado e queremos ir dormir.

_ Ah, Zero, eu tava quase conseguindo! Me dá mais uns treze minutos e eu consigo fazer ela falar...!

_ Vai ficar pra amanhã, Mad – Zero retrucou com ar vazio, ainda rebocando o amigo – A menina tá cansada. Todas as meninas tão cansadas. E, é melhor você ter lavado aqueles casacos de piloto que arrumou pra elas se cobrirem...

_ Bom, tá precisando dar uma batidinha pra tirar o pó...

_ Hã... – Daniel olhou para os dois que saíam, para Laírton e então para Melissa – Acho que nós... veremos vocês pela manhã. Se... por acaso precisarem de ajuda...

_ Não vamos – Christabel disse com ar vazio, tomando o rumo do quarto – Viemos pelo subsolo e nos afastamos. Não tornarão a nos encontrar tão depressa.

As outras olharam para cima, onde a Rainha ia, e então de volta para Daniel, e Melissa deu de ombros. Christabel devia estar certa; ao menos por aquela noite, não era de se esperar que tivessem problemas. E Sari estava entre elas, e Christabel recuperara o uso de seus poderes. Se algo de fato contrariasse as expectativas e acontecesse, dificilmente seriam pegos de surpresa.

Sunday, January 14, 2007

Leitores e leitoras dominicais, saudações autorais do Louco!

Esqueci de perguntar, tem alguém aí querendo ver a minha caveira? Digo, depois do que eu fiz com o velho Dirceu? Foi mal, gente, eu tbm curtia ele. *dando de ombros* São as circunstâncias e a personalidade de um personagem, às vezes, que levam ele ou ela a seguir esses caminhos.

Ao menos, ele se foi com estilo... E parece q os pais continuam cuidando dos filhos, no matter what, né não?

Bom, chega de embaçar e vamos pra história. Continuando daqui...

(...)



Os viajantes prontamente se voltaram na direção da voz, Sari, Christabel e Freya já em postura de ataque, todos olhando para o topo da escadaria estreita. E de uma porta aberta lá em cima, viram um rapaz com roupas que pareciam do século anterior, tremendamente empoeiradas e manchadas de ferrugem, apontando uma versão diferente da espingarda de Zero para eles. Mas a postura estava relaxada, a arma mais voltada para baixo do que para o grupo, propriamente. E Zero, sem parecer sequer incomodado, comentou:

_ Cê nunca troca essas roupas não, Mad? Ou conseguiu deixar todos os trapos que você usa melecados do mesmo jeito? Parece que eu te vi desse mesmo jeito da última vez que eu vim.

_ Deve ser, eu não lembro – o desconhecido respondeu, descendo os degraus estreitos com alguma reserva ainda, mas parecendo sorrir sob a atitude alerta – O que aconteceu? Fazia a maior cara que você não aparecia aqui, Zero! Sumiram por quê?

_ Uma pá de coisa, camarada – Zero esforçou-se para ficar de pé, no que foi auxiliado por Freya – Uma história comprida pra caramba, mas que eu te conto direitinho depois... se você der uma força aqui. Eu tô meio estragado.

_ Estragado? – a expressão do outro mudou, baixando a arma comprida totalmente e jogando-a nas costas, apressando-se em descer a escadaria – Você tá machucado? O que te aconteceu, irmãozinho?

“Irmãozinho?” – a mesma pergunta pareceu ocorrer a todos, que se entreolharam em silêncio. Afinal, quantos ‘irmãos’ Zero tinha? E o estranho rendeu Freya, apoiando Zero sobre seu ombro esquerdo e só então parecendo reparar melhor nos recém-chegados.

_ Vocês tão com uma cara de canseira... É melhor conversar lá em cima; tem lugar pra tomar banho, sentar e até deitar se vocês preferirem. As perguntas ficam pra depois.

_ Você... nem quer saber quem somos? – Sari perguntou, admirada.

_ Não preciso – o desconhecido pareceu dar de ombros, ajudando Zero a subir – Vocês chegaram com o Mano Zero; então, são legais. Ah, e meu nome é Maddock. Hermes Maddock. Sejam bem-vindos ao Cemitério de Aviões.

_ Bem-vindos aonde?

_ Cemitério de Aviões – Maddock respondeu alegremente, conduzindo Zero e os outros para o alto – Minha casa! A vista talvez não seja tão bonita quanto alguns de vocês poderiam querer, mas fazer o quê? Cada um é cada um, né?

O comentário fez pouco ou nada para esclarecer qualquer um dos viajantes, e eles limitaram-se a seguir o desconhecido, sem conseguir no entanto ignorar um fato que parecia comum a todos.

_ Mel, me corrija se eu estiver errado – Daniel comentou baixinho – mas esse Maddock... A atitude dele lembra muito o próprio Zero, não?

_ É, eu também tava pensando nisso – Melissa acenou com a cabeça – Ele me passa a mesma sensação que eu tive quando conheci o Zero. E, esse negócio de ‘irmãozinho’...

Maddock, enquanto isso, conduzia Zero para o alto sem parecer ouvir as vozes sussurradas atrás de si. Ou sem parecer notar o olhar do amigo para ele.

_ Escuta, Mad... Tem uma coisa que você precisa saber...

_ É o seu pai, não é? – Maddock perguntou sério, sem olhar para Zero, e diante da surpresa do outro ele apenas acenou afirmativamente, sem se voltar – Esquece. Eu sou ligeiro o bastante pra deduzir umas coisas só de vocês terem chegado sozinhos. Dá pra ver que algo não vai bem com o Velho Dirceu. Mas me conta depois; a gente deve ter algum tempo pra conversar mais tarde.

_ N-não, talvez não... Escuta, os túneis não são seguros. Era melhor se você...

_ Já falei pra não me contar! – Maddock estapeou a testa de Zero sem qualquer cerimônia, e com força suficiente para o estalo chamar a atenção de todos que vinham atrás deles – Deixa que dos túneis cuido eu, e você explica pro seu pessoal como funciona o sistema de banho daqui, que acho que todo mundo vai querer dar uma relaxada. Vocês tão com cara de que fizeram toda a distância da Sucata até aqui correndo, e de que podiam aproveitar pra descansar um pouco.

_ Olha, eu não sei quem é você, mas toma cuidado com o Zero – Freya adiantou-se, enquanto Melissa subia meio que amparada por Daniel e os demais seguiam de perto escada acima – Os ossos dele foram tratados faz pouco tempo, porque ele tava num desabamento; estão restaurados, mas fracos, podem quebrar de novo muito fácil...

_ Então foi por isso que vocês vieram pra cá, Tata?

Freya chegou a se deter na subida, sendo chamada tão displicentemente por seu apelido por alguém que nem a conhecia. Mediante o silêncio da surpresa dela, Maddock permitiu-se olhar para trás e piscar.

_ Ué, foi assim que eu ouvi o Mano Zero chamar você!

_ M-meu nome... – ela sacudiu a cabeça, parecendo recuperar a compostura enquanto voltava a seguí-los – Você pode me chamar de Freya.

_ Deusa da Terra, né? – ela novamente arregalou os olhos, e Maddock deu de ombros – Mas eu não sou viking, e não acredito que alguém tenha ‘mesmo’ te dado esse nome. Anda, pode me falar; prometo que não espalho por aí.

_ A Tata é membro... dos ‘Dragões’, Mad – Zero atalhou – Pelo certo, não pode ficar falando o nome dela por onde andar.

_ O quê, você acha que eu vou com vocês até a Avançada só pra contar pros colegas dela que eu sei o nome verdadeiro da menina? – Maddock bateu novamente na testa de Zero, que protestou.

_ Ô animal, pega leve! Isso aí dói! E eu tô machucado, você não ouviu não, cara?

_ Tô me lixando pros seus problemas, Zero. Larga de ser chorão, já vamos dar um jeito nisso... Se o problema são seus ossos, pelo menos, eu tenho como resolver.

Chegaram ao topo da escadaria, que dava para um aposento amplo com poucos móveis. O alçapão que conduzia ao porão era parecido com o da casa de Dirceu, e enquanto o grupo subia, Maddock largou Zero sobre o que parecia um velho sofá empoeirado e pediu:

_ Tudo bem, me diz depois o seu nome, Tata, mas agora cuida desse mané aqui um pouco, por favor. Se a crise são os ossos dele, acho que vocês vieram pelos meus exoesqueletos; não são grande coisa, apesar do nome, mas devem sustentar a ossada do Zero no lugar até ele ficar legal. Espera só um pouco que eu vou pegar.

_ Meu nome... é Freya – a Dragonesa retrucou, parecendo mais nervosa do que qualquer um dos outros a vira até então – Só o Zero pode me chamar de Tata.

Para surpresa dela, Maddock sorriu e piscou, novamente lembrando muito Zero na sua maneira de agir.

_ Beleza, Tata. Espera um pouquinho aí, faz favor.

E subiu escada acima sem parecer fazer conta da carranca da moça atrás de si, ou do riso abafado de Melissa, Daniel e Laírton. Christabel olhava para ele incomodada, como se já tivesse vivido uma situação parecida antes. E Zero, assim que o outro desaparecera no andar superior e o barulho de metal sendo revirado começara, comentou:

_ Sabe, é estranho falar isso, mas o Mad até tem alguma razão, Tata; não tem nenhum dos outros Dragões aqui, e meio que à força, você veio com a gente. Ia ser mais legal se todo mundo soubesse seu nome de verdade...

_ Zero, você conhece as regras – Freya sacudiu a cabeça, parecendo incomodada – Nenhum Dragão tem permissão de dizer o verdadeiro nome enquanto estiver em missão. Sabe que eu aceitei as condições quando me alistei...

_ Nah, tudo bem, desculpa aí, eu não sei onde tava com a cabeça.

Mas Freya e também os demais olharam com desconfiança para ele; Zero não era de desistir tão fácil de um ponto de vista. E isso ficou claro quando ele continuou:

_ Afinal, você tem razão, né? Quanto tempo, afinal, até o velho Mad desencanar disso? Logo ele, que foi o meu modelo de como encher o saco dos outros com estilo..

Aquilo podia, e devia ser mentira; mesmo assim, o olhar de Freya para Zero pareceu preocupado sob o visor. Rindo um pouco ao ver a preocupação da amiga, ele pareceu lembrar de outra coisa e fez sinal para que ela sentasse:

_ Vai, deixa isso pra lá; ao invés, deixa eu te apresentar os meus amigos e irmãos de armas. Sabe, pra você saber com quem eu tenho andado. Essa loirinha bonita aqui é a Melissa, uma maga negra que tava aprendendo sobre as escavações e reparos comigo e com meu pai...

_ Zero... Sobre o seu pai...

Zero voltou-se para Laírton, e para todos os outros. Era óbvio que mencionar o pai os deixara preocupados quanto à sua reação. E ele baixou os olhos, ainda com um sorriso suave no rosto.

_ Valeu Lairton... mas não precisam encanar com isso. Eu tô legal, acho.

_ Quer parar com isso? – Melissa bradou, pisando duro na direção de Zero – Você não tá legal coisa nenhuma! O seu pai acabou de... De...!

_ É, eu acho que sim – Zero segurou a mão dela, e embora o sorriso se mantivesse, a tristeza no seu olhar era indisfarçável – Não precisa se torturar pra dizer, irmãzinha. É o que eu acho, também. É só que... não tô conseguindo chorar agora.

_ ‘Não consegue...’ chorar? Ah, Zero...

_ Anda, me dá um abraço, vai. O velho chato deixou nós dois sozinhos agora. Você também deve ter ficado chateada.

Tuesday, January 09, 2007

Olá gente que lê! Olá povo que resiste bravamente! Em nome da sua coragem, e com um sorrisão de orelha a orelha, saudações do Louco!

Sim, vamos começar 2007 com tudo! Tô inspirado, e retomei meus trabalhos com a Christie, galera! Acho que agora vai! E pra provar o que digo, começo o último docoumento pronto até aqui, 'Um Louco Capaz Até de Pilotar Aviões'. Heh, duvido que alguém saiba, ou lembre, de onde eu tirei isso... ^_^

Amplexos autorais do Louco, e vamos que vamos!!!


XXXI – Cemitério de Aviões



Nenhum dos passageiros do Velocípede estava esperando pela súbita arremetida no momento em que Dirceu arrebentara a válvula do tanque de propelente, lançando-os à deriva pelo sistema de trilhos subterrâneos que levava para longe do porão secreto onde haviam estado.

Pouco haviam se afastado quando ouviram um outro som; uma explosão ao que parecia. Zero, Melissa e Freya, mais familiarizados, reconheceram o disparo de uma espingarda de grosso calibre. Segundos depois, um novo disparo e um clangor pesado de metal. Uma comporta se fechara atrás deles.

Freya foi a primeira a se recuperar. Sua mente estava abalada como a da maioria, mas um dos motivos que a tornava tão útil aos Dragões era ser sempre prática, colocando prioridades antes das emoções em casos extremos, e assim, ela tomou lugar no volante do Velocípede.

_ Zero! – ela chamou, mantendo os olhos voltados para frente – Você deve conhecer melhor o caminho! Me diga pra onde viram as curvas com antecipação, ou eu posso não reagir depressa o suficiente, e a última coisa que eu vou querer é capotar a essa velocidade!

Zero não respondeu de pronto, o olhar perdido. A Marcadora continuava em suas duas mãos, embora baixa, e o cérebro dele ainda não parecia capaz de assimilar corretamente o que tinha acontecido. Se Tur tivesse se lançado sobre eles, mesmo com o risco, ele estava certo de que poderia abater o Arcano com um tiro certeiro, pouco importando qual fosse a consequência aos seus ossos.

Mas antes da investida do inimigo, o pai estava com aquela bengala erguida, e então arrebentou a válvula do propelente ao invés de encaixar o gancho, e ele não poderia impedir aquilo com um disparo à distância. Sua mente continuava presa com a necessidade e a impossibilidade de agir, e seus olhos continuavam voltados para a retaguarda, mesmo com uma ladeira que os conduzira para baixo e para longe já os afastando.

_ Zero! – o tapa de Freya em seu rosto o sobressaltou, mas também pareceu trazê-lo de volta à realidade. O vento do deslocamento, o cheiro de terra por toda a parte, o frio comum de túneis também se tornaram claros, e ele conseguiu ouvir o que a amiga dizia – As curvas! Você precisa me dizer, pra que lado!!

_ Ah... Tá. Tudo bem, Tata, eu... sinto muito – ele sacudiu a cabeça, como se despertasse – Quer trocar comigo e deixar eu pilotar?

_ Sem trancos, lembra? – Freya retorquiu com impaciência – Pra que lado? Fala!

_ Tá... Tudo bem, então – ele firmou as mãos nas bordas do vagonete, voltando-se para frente – Fica de olho agora... Depois da pilastra grande à direita, tem um desvio pra a direita e a gente deve subir um morrinho... Depois, vira direto pra esquerda.

Mas Sari e Christabel imediatamente voltaram suas atenções para Zero. Ele estava de volta, de certa forma. A voz estava apática, dando a informação necessária para que Freya pudesse conduzir com segurança o Velocípede, mas transparecendo o quanto ele parecia amortecido por dentro. Em alguma parte dentro de si, já deveria ter entendido o que acontecia, e porquê os Arcanos ainda não os estavam perseguindo.

“De algum modo, Seu Dirceu deve tê-los retardado – Sari pensou – Um desabamento não bastaria para matar um deles, mas aquele que caiu não parecia totalmente recuperado do último confronto. Mas... Um ser humano sozinho contra Arcanos...”

Christabel voltou os olhos para trás. O velho teimoso...! Por mais habilidoso que fosse, não teria a menor chance contra dois Arcanos sozinho.

“E agora, a família dele também se foi”

Voltou seus olhos para Zero, guiando Freya enquanto esta conduzia o vagonete em sua corrida desenfreada pelos túneis. E pensou ter visto algo que lhe era muito familiar, algo de quando ficara realmente sozinha.

Em outra parte, uma gigantesca montanha estremeceu. Havia uma força primordial oculta dentro dela, descansando. Ao menos, descansara até aquele momento, mas não tornaria a fazê-lo ali.

A criatura era imensa, e seu poder era tamanho que aquela montanha não significava mais do que um lençol seria para um humano sentado numa cadeira. Ele agora se desfazia dela quase sem dar atenção, muito mais concentrado no que podia perceber com a súbita ausência em sua mente de Ahl-Tur e seus seguidores. E a criatura sabia que a maioria daquelas desaparições era definitiva; podia sentir aquela parte de si desaparecendo para nunca mais retornar.

“Maldito seja, Ahl-Tur! Como pôde falhar novamente??”

Os demais Arcanos se moviam, fugindo apressadamente da caverna que lhes servira de lar e local de descanso nos últimos anos. Todos tinham sido trazidos de volta à vida com o tempo, mas apenas alguns dos melhores tinham acompanhado o Mestre deles. E alguns dos que permaneceram já tinham compreendido que muitos companheiros não voltariam.

_ Vett, como é possível que os outros tenham sido abatidos de novo? – perguntou um dos mais jovens – Será que foram aqueles malditos...

_ Pense o que quiser, Tahr, mas saia da minha frente! – a Arcana retrucou, empurrando o outro do caminho – Essa caverna está vindo abaixo, se é que não reparou!

Os Arcanos, pouco menos de cinquenta, abandonaram o abrigo ao mesmo tempo em que seu líder se punha de pé. Ao fazê-lo, a imensa figura de pedra demoliu totalmente a montanha, sacudindo a cabeça para remover os últimos escombros de sobre si. Houve um tempo, ele pensou então, em que as rochas teriam ficado enroscadas em seus cachos longos e prateados; agora, usava um eterno capacete rochoso.

Mas, estava divagando. Mais importante era fazer o que seus servos insistiam em fracassar ao tentar.

“Não pretendia me mover tão cedo... Os malditos Espíritos ainda estão à solta; posso sentir sua presença, mesmo oculta. Mas, se quero recuperar o que é meu direito...!”

Teria que se arriscar. Mesmo no final, seu poder era uma força a ser reconhecida. E se qualquer um de seus opositores naturais tentasse causar-lhe problemas...

_ ... haverá de se lembrar com quem está lidando.

Relâmpagos cortaram o céu e uma tempestade pesada, não exatamente água, começou a despejar-se sobre o colosso e seus Arcanos. E em torno do mundo inteiro, foi como se um calafrio profundo percorresse cada ser vivo.

O mesmo calafrio alcançou um viajante solitário que passava pela cidade de Garland, embora aquilo não servisse para deixá-lo inquieto, ou assustado de forma alguma. Ao invés, ele olhou na direção exata da montanha demolida e abriu um sorriso suave.

_ Ora... Até que enfim, Alexandre! – o viajante murmurou, baixo demais para que qualquer pessoa naquele bar pudesse ouví-lo – Então, é o momento para o Rei Negro finalmente se mover no tabuleiro...

Ele sabia muito bem que Alexandre dificilmente se moveria sem ter conseguido recuperar seus poderes; por maior que fosse sua força no passado, ele a desperdiçara de várias formas ao longo do tempo. E o exílio forçado sem dúvida o esgotara ainda mais. O viajante se indagava o quanto de seu poder não fora consumido apenas no esforço de retornar. A idéia que tivera para recuperar-se fora brilhante, era preciso reconhecer. Porém...

“Ele não conseguiu. Ainda não. Seu despertar teria sido algo muito diverso se ele estivesse plenamente recuperado. E, se foi forçado a deixar seu abrigo... é porque as coisas não estão indo bem”

Sorriu um pouco mais abertamente, bebendo um gole generoso de café para disfarçar a expressão satisfeita. Era verdade, sua perseguição a pé estava sendo lenta, mas compensava para ele poder acompanhar os detalhes da louca escapada de Christabel, e descobrir sobre as pessoas que a auxiliavam.

Parecia tolice que ela esperasse se libertar da tiara. Claro, era a única esperança para a menina, não esperaria menos dela. Mas a Rainha estava sob controle, e sob controle ela haveria de ficar. Não lhe serviria de nenhum outro modo.

“Eu faria de outra forma se pudesse, criança. Você, sem dúvida, já teve a sua cota de infortúnios. Mas, se acha que sabe o que é esperar...”

Ele sacudiu a cabeça, numa negativa veemente. Não, Christabel não tinha a menor idéia do que era esperar. Ninguém naquele mundo... aquele mundo inteiro... Não havia como saberem. Ninguém compreenderia aquilo como ele próprio. Não tinha qualquer intenção real de fazer mal à Rainha, mas se isso era necessário para que se libertasse... seria feito.

Em outro lugar, o Velocípede se deteve. Não tinham dito muito durante a viagem, com Zero indicando as direções de forma semiconsciente para Freya, Daniel tentando ignorar seu medo de viagens rápidas demais para consolar Melissa, que tentava sufocar seu choro como podia e Laírton entoando uma oração em voz baixa. Os pensamentos de todos estavam voltados para o que certamente teria acontecido com o Velho Dirceu e em como Zero estaria se sentindo.

E ele próprio, curiosamente, não saberia definir como se sentia naquele momento. Sabia que deveria chorar; o pai se fora, sabia disso. No entanto, embora estivesse ciente de que tudo o que vivesse dali em diante, fossem dias ou décadas, não teria mais a presença ou supervisão do Seu Dirceu... era como se todo o seu ser estivesse por trás de uma espessa cobertura de papelão, isopor ou coisa do tipo. A necessidade de chorar estava ali, a consciência da falta que o pai lhe fazia estava lá também... mas ele não parecia poder sentir.

“Parece até que eu tô anestesiado... mas, dane-se. Depois eu vejo isso. Primeiro o que vem primeiro, depois o que vem depois”.

_ Escuta, Zero – Freya perguntou displicentemente – Eu não quis perguntar nada antes, mas... Agora que já chegamos, dava pra me dizer onde é esse lugar? Três tanques de propelente, um monte de linhas divergentes no meio do percurso... pra nos trazer aonde?

_ Dá uma olhada ao redor, Tata. O que parece?

Todos os viajantes olharam ao redor. O Velocípede se detivera no que parecia um salão subterrâneo amplo, muito maior do que o porão de Dirceu, com mais linhas férreas laterais além da que tinham utilizado. Parecia haver uma plataforma circular logo abaixo deles, como se todo o piso sob o vagonete fosse móvel. Havia também uma escadaria comprida e estreita à esquerda do ponto onde tinham parado; aquilo não parecia coisa alguma que a maioria deles tivesse jamais visto.

_ Uma estação de parada de algum tipo – Freya respondeu, olhando inquieta à esquerda e à direita – O Velocípede não vai a lugar nenhum a partir daqui, isso dá pra ver. Mas onde é ‘aqui’, exatamente?

_ Vários quilômetros a sudeste da Cidade Sucata, num lugar totalmente desconhecido pra qualquer um dos crânios da Avançada – Zero respondeu inexpresivamente – Eles nem imaginam que esse lugar aqui existe, de acordo com o Velho Dirceu. E o motivo...

_ ... o motivo é que nós não queremos. Só isso.