(...)
Nos fundos do posto, um pouco afastada do prédio, a Rainha não parecia distraída com coisa alguma. Sua mente estava totalmente voltada ao seu treinamento, ao que tudo indicava: os olhos estavam focalizados, a respiração perfeita, ela nunca fazia um movimento que fosse desnecessário. A intenção original era exercitar o novo ataque, uma combinação de sua espada e a magia que pudera manifestar apesar da tiara, mas por fim resolvera fazer um pouco de aquecimento antes.
Não havia como confundir, estava ali! Ele admirou-se com o que viu; uma fêmea humana, potencialmente poderosa com o dom da manipulação dos elementos... e mais ainda! O curioso era que ela não parecia bem. Ele podia notar, havia algo de não natural acontecendo. De alguma forma, aquela poderosa feiticeira estava de posse de todo o seu poder, mas não tinha como usa-lo.
E ele sorriu, seus dentes numerosos à mostra, enquanto a língua passava por eles. Aquilo era muito bom, quase bom demais para que fosse verdadeiro. Se fosse humano, ele poderia comparar tal acontecimento com ganhar um presente, com um pacote frágil contendo o que tanto queria. Ela parecia ter alguma habilidade de combate, praticando movimentos com uma lâmina com a graça de uma dançarina, mas não havia nada de especial neles. Sim, ela estava mesmo limitada... a ponto de, certamente, nem poder perceber sua presença sob sua camuflagem.
Christabel avançou, saltando adiante e investindo com a espada, a lâmina voltada para baixo e acompanhando seu antebraço. Talhou o ar para a esquerda, trocando a espada de mãos enquanto fazia isso, e tornou a atacar o inimigo que sua mente criara.
Girou, dobrou seus joelhos e ficou próxima ao solo, como se aguardando por sua chance, como uma serpente antes do bote. Por alguns instantes, ela ficou tão imóvel quanto uma estátua, mal parecendo respirar. Então ficou de pé novamente, desfazendo a postura, e voltou-se para a lateral do prédio, perguntando em voz alta:
_ Não está na hora de se mostrar? Eu já sei que está aí.
Por um longo instante, nada aconteceu. Então, o ar tremeluziu e uma figura enorme se materializou diante dos olhos da Rainha, mas se esperava deixa-la admirada, não parecia ter tido qualquer sucesso. A criatura tinha basicamente forma humanóide, com cabeça, tronco e membros, mas parecia-se mais com um crocodilo gigante vestido em algo que parecia uma armadura de madeira, formada de braçadeiras, caneleiras e o protetor peitoral. A criatura portava uma espada longa curva, semelhante à arma de Christabel em tudo, exceto quanto ao tamanho. Ele estivera rastejando rumo ao solo, algo que decerto o ajudava com sua camuflagem, mas ficou de pé sobre as pernas traseiras, parecendo sorrir ao exibir seus múltiplos dentes serrilhados ao se apresentar.
_ Impressionante... Sentidos aguçados ao que parece. Saudações então, menina humana. Você, decerto, é a tão falada arquimaga humana Christabel. Há muitos de nós à sua procura, e fico feliz que Sáurio tenha sido o primeiro a encontra-la.
_ Você fala demais – a Rainha retrucou, ainda não parecendo impressionada com a criatura – Desapareça. Está atrapalhando minha concentração.
O ser chamado Sáurio olhou com alguma consternação para Christabel. Seria possível que estivesse errado...? Não, o poder dela realmente estava contido. Então, que vantagem ela teria para estar tão confiante dele, maior e mais poderoso? A menos que fosse uma tola por completo.
_ Acredito... que não tenha entendido muito bem sua situação, larva humana – Sáurio ergueu os dois braços, o crepitar de magia cintilando em suas escamas por um longo momento, enquanto erguia sua cabeça e se regozijava – Por sete vezes Sáurio esteve em combate contra criaturas poderosas, e nas sete vezes Sáurio as derrotou! E tomou seus poderes! O que acha então que Sáurio vai fazer a...
Ele interrompeu-se, pois ao baixar sua cabeça viu que Christabel estava correndo para ele, curvada para frente e próxima ao solo tanto quanto possível, o braço esquerdo diante do rosto como se protegesse sua visão do vento, e o direito trazendo consigo a espada com a lâmina voltada para trás de si. E sua velocidade era incrível! Em meio ao gramado alto e mau cuidado ao redor do posto abandonado, ela quase desapareceria se curvasse seu tronco um pouco mais.
Tomado por surpresa, o grande lagarto só teve o tempo de sacar sua própria arma e coloca-la diante de si, bloqueando o primeiro corte da espada de Christabel, mas sem levar em conta sua postura e a velocidade do impacto dela quando saltou.
Seu deslocamento e o impulso extra da espada, trazida de trás para diante num movimento de pêndulo, resultaram num impacto forte o bastante para que a Rainha saltasse para trás e girasse no ar, detendo-se de pé sobre a grama. Sáurio, por outro lado, fora desequilibrado com o choque quase à altura de seu peito, evidentemente surpreendido por tal temeridade. O lagarto tombou de costas no solo, braços e pernas abertos como uma estrela, e rapidamente sentou-se para se defender, agora parecendo irritado.
Christabel continuava imóvel onde caíra, e apontou a espada para ele antes de retrucar, com a mesma fisionomia inexpressiva:
_ Quem não entendeu foi você, criatura. Eu mandei que desaparecesse. Não vou repetir.
_ Sim... claro que vou desaparecer, criança... – Sáurio colocou-se de pé, sibilando – Sáurio irá embora assim que tiver o que veio buscar... o poder, escondido em sua carcaça mortal!
Sáurio ergueu a espada pesada e atacou Christabel, parecendo mais veloz do que um humano poderia enfrentar. A Rainha firmou sua própria espada em mãos, franzindo um pouco o rosto ao sentir a primeira tentativa da tiara em conter seu poder. Resistiu. Aquela não era a hora de fraquejar.
O corte lateral de Sáurio, terminando no solo, era mais do que seria necessário para cortar qualquer coisa ao meio, e por isso mesmo Christabel recuou com um salto, saindo do campo de corte antes de lançar-se à ofensiva.
Seu poder não podia sair; a tiara impedia isso. Mas dentro do próprio corpo todo o seu potencial ainda existia, e mesmo causando-lhe as dores da restrição, ela descobrira ser capaz de usar magia para reduzir o próprio peso, ou amplia-lo. Ela reduzira o próprio peso no momento do salto, indo mais longe no recuo do que seria de se esperar num humano. Havia um sorriso de desafio em seu rosto, enquanto corria para a direita. Não podia lutar com pleno poder, mas não estava indefesa. Nunca estaria indefesa.
Sáurio tornou a atacar, erguendo a garra esquerda e formando nela uma bola de fogo. Christabel reconheceu o feitiço e desviou-se na hora certa, aproximando-se do lagarto enquanto o solo explodia. Sua espada foi torcida para baixo, a mão esquerda também agarrou o punho para aumentar a força do golpe enquanto Sáurio golpeou para baixo, pronto para esmagar a criatura insolente.
O clangor do metal foi impressionante, e o lagarto tornou a surpreender-se com a potência do ataque de Christabel. Aquilo era impossível! Por poderosa que fosse, ela não era uma guerreira! Sua força não deveria...! E enquanto ele surpreendia-se, um milésimo de segundo lento demais com a distração, a Rainha deteve sua investida e recuou, desta vez movendo a espada ao contrário, marcando o ventre de Sáurio com um talho lateral e fazendo-o urrar de forma horrível enquanto ela rolava para fora do alcance de sua espada e punha-se de pé, em guarda e concentrada.
_ Venceu sete vezes subestimando seus oponentes? – ela perguntou, o rosto parcialmente oculto pela mão e pelo punho da espada – Então, eles mereciam morrer. Mas torne a faze-lo comigo, e será você a morrer hoje.
_ Miserável... – Sáurio tocou o ventre ferido, sem poder acreditar de fato. Como ela podia ter força física para resistir à dele, e para cortar sua armadura reforçada por magia? Ele não conseguia sentir que Christabel estava manipulando o peso do próprio corpo, e espada. Cada um de seus ataques tinha a força ampliada daquela forma, fazendo seus golpes tão poderosos quanto o do guerreiro mais forte do mundo, tornando-a mais do que páreo para ele. E não seria ela a contar a ele – Como pode...? Como se atreve...?!
_ Opa, dá licença aí?
_ Não está na hora de se mostrar? Eu já sei que está aí.
Por um longo instante, nada aconteceu. Então, o ar tremeluziu e uma figura enorme se materializou diante dos olhos da Rainha, mas se esperava deixa-la admirada, não parecia ter tido qualquer sucesso. A criatura tinha basicamente forma humanóide, com cabeça, tronco e membros, mas parecia-se mais com um crocodilo gigante vestido em algo que parecia uma armadura de madeira, formada de braçadeiras, caneleiras e o protetor peitoral. A criatura portava uma espada longa curva, semelhante à arma de Christabel em tudo, exceto quanto ao tamanho. Ele estivera rastejando rumo ao solo, algo que decerto o ajudava com sua camuflagem, mas ficou de pé sobre as pernas traseiras, parecendo sorrir ao exibir seus múltiplos dentes serrilhados ao se apresentar.
_ Impressionante... Sentidos aguçados ao que parece. Saudações então, menina humana. Você, decerto, é a tão falada arquimaga humana Christabel. Há muitos de nós à sua procura, e fico feliz que Sáurio tenha sido o primeiro a encontra-la.
_ Você fala demais – a Rainha retrucou, ainda não parecendo impressionada com a criatura – Desapareça. Está atrapalhando minha concentração.
O ser chamado Sáurio olhou com alguma consternação para Christabel. Seria possível que estivesse errado...? Não, o poder dela realmente estava contido. Então, que vantagem ela teria para estar tão confiante dele, maior e mais poderoso? A menos que fosse uma tola por completo.
_ Acredito... que não tenha entendido muito bem sua situação, larva humana – Sáurio ergueu os dois braços, o crepitar de magia cintilando em suas escamas por um longo momento, enquanto erguia sua cabeça e se regozijava – Por sete vezes Sáurio esteve em combate contra criaturas poderosas, e nas sete vezes Sáurio as derrotou! E tomou seus poderes! O que acha então que Sáurio vai fazer a...
Ele interrompeu-se, pois ao baixar sua cabeça viu que Christabel estava correndo para ele, curvada para frente e próxima ao solo tanto quanto possível, o braço esquerdo diante do rosto como se protegesse sua visão do vento, e o direito trazendo consigo a espada com a lâmina voltada para trás de si. E sua velocidade era incrível! Em meio ao gramado alto e mau cuidado ao redor do posto abandonado, ela quase desapareceria se curvasse seu tronco um pouco mais.
Tomado por surpresa, o grande lagarto só teve o tempo de sacar sua própria arma e coloca-la diante de si, bloqueando o primeiro corte da espada de Christabel, mas sem levar em conta sua postura e a velocidade do impacto dela quando saltou.
Seu deslocamento e o impulso extra da espada, trazida de trás para diante num movimento de pêndulo, resultaram num impacto forte o bastante para que a Rainha saltasse para trás e girasse no ar, detendo-se de pé sobre a grama. Sáurio, por outro lado, fora desequilibrado com o choque quase à altura de seu peito, evidentemente surpreendido por tal temeridade. O lagarto tombou de costas no solo, braços e pernas abertos como uma estrela, e rapidamente sentou-se para se defender, agora parecendo irritado.
Christabel continuava imóvel onde caíra, e apontou a espada para ele antes de retrucar, com a mesma fisionomia inexpressiva:
_ Quem não entendeu foi você, criatura. Eu mandei que desaparecesse. Não vou repetir.
_ Sim... claro que vou desaparecer, criança... – Sáurio colocou-se de pé, sibilando – Sáurio irá embora assim que tiver o que veio buscar... o poder, escondido em sua carcaça mortal!
Sáurio ergueu a espada pesada e atacou Christabel, parecendo mais veloz do que um humano poderia enfrentar. A Rainha firmou sua própria espada em mãos, franzindo um pouco o rosto ao sentir a primeira tentativa da tiara em conter seu poder. Resistiu. Aquela não era a hora de fraquejar.
O corte lateral de Sáurio, terminando no solo, era mais do que seria necessário para cortar qualquer coisa ao meio, e por isso mesmo Christabel recuou com um salto, saindo do campo de corte antes de lançar-se à ofensiva.
Seu poder não podia sair; a tiara impedia isso. Mas dentro do próprio corpo todo o seu potencial ainda existia, e mesmo causando-lhe as dores da restrição, ela descobrira ser capaz de usar magia para reduzir o próprio peso, ou amplia-lo. Ela reduzira o próprio peso no momento do salto, indo mais longe no recuo do que seria de se esperar num humano. Havia um sorriso de desafio em seu rosto, enquanto corria para a direita. Não podia lutar com pleno poder, mas não estava indefesa. Nunca estaria indefesa.
Sáurio tornou a atacar, erguendo a garra esquerda e formando nela uma bola de fogo. Christabel reconheceu o feitiço e desviou-se na hora certa, aproximando-se do lagarto enquanto o solo explodia. Sua espada foi torcida para baixo, a mão esquerda também agarrou o punho para aumentar a força do golpe enquanto Sáurio golpeou para baixo, pronto para esmagar a criatura insolente.
O clangor do metal foi impressionante, e o lagarto tornou a surpreender-se com a potência do ataque de Christabel. Aquilo era impossível! Por poderosa que fosse, ela não era uma guerreira! Sua força não deveria...! E enquanto ele surpreendia-se, um milésimo de segundo lento demais com a distração, a Rainha deteve sua investida e recuou, desta vez movendo a espada ao contrário, marcando o ventre de Sáurio com um talho lateral e fazendo-o urrar de forma horrível enquanto ela rolava para fora do alcance de sua espada e punha-se de pé, em guarda e concentrada.
_ Venceu sete vezes subestimando seus oponentes? – ela perguntou, o rosto parcialmente oculto pela mão e pelo punho da espada – Então, eles mereciam morrer. Mas torne a faze-lo comigo, e será você a morrer hoje.
_ Miserável... – Sáurio tocou o ventre ferido, sem poder acreditar de fato. Como ela podia ter força física para resistir à dele, e para cortar sua armadura reforçada por magia? Ele não conseguia sentir que Christabel estava manipulando o peso do próprio corpo, e espada. Cada um de seus ataques tinha a força ampliada daquela forma, fazendo seus golpes tão poderosos quanto o do guerreiro mais forte do mundo, tornando-a mais do que páreo para ele. E não seria ela a contar a ele – Como pode...? Como se atreve...?!
_ Opa, dá licença aí?