Sunday, July 30, 2006

Leitores, leitoras, gente que curte histórias de ficção, magia e etecéteras, saudações de novo. De um terminal meio zoado, saudações do Louco!

Detonemos, pois. Lembram do tiozinho que deu os visores do Zero?

É, ele mesmo. Vejamos a que ele veio.

(...)

Duas explosões menores soaram aos ouvidos do encapuzado, a segunda acompanhada de uma dor aguda em seu peito e uma súbita dificuldade em respirar. Ele apertou o peito... e então descobriu o sangue escorrendo. Viu admirado que sua adaga estava no chão, a lâmina longa partida de um lado e o cabo ainda rodopiando para o outro lado. Na mão esquerda do velho mendigo, uma pistola fumegante. De algum modo, ele antecipara o movimento e disparara duas vezes, uma na lâmina e uma no encapuzado, que ainda estava admirado demais para falar quando caiu.

O mendigo se aproximou com um olhar sombrio para o encapuzado, que parecia estar rindo em seus últimos estertores, sangue brotando da boca. Com dificuldade ele murmurou:

_ Vai... acontecer de... qualquer modo. M-meus companheiros...

_ ... tão te esperando no inferno – o mendigo replicou, sorrindo sombriamente mediante o silêncio admirado do outro – Quatro deles, teimosos igual você. O outro se entregou numa boa, achando que vocês iam terminar o serviço. Babaca.

O olhar do assassino de Melk escureceu devagar, ainda vidrado enquanto seus pensamentos aceleravam. Quem era aquele velho mendigo, afinal, e como pudera pegar a todos eles? Os seis estavam determinados a cumprir com sua missão, ele não podia imaginar que qualquer um deles tivesse denunciado os demais. Então, como descobrira a todos? Era o que tinha em sua mente quando seu último estertor fez mais sangue jorrar de sua boca, e ele parou de se mover.

Passos apressados vieram de trás do mendigo, que não se deu sequer ao trabalho de se voltar. Coisa típica da Cidade Avançada e da Sucata, tiros atraíam a atenção muito depressa. Um centurião com armadura pesada vinha correndo em sua direção e, também como de costume, fazia questão de paralisar o possível transgressor com a voz antes de fazê-lo pessoalmente.

_ Alto! Você aí, parado agora mesmo! O que pensa que está...

Ele voltou-se então, o olhar severo fazendo o novato engasgar. Bom, ao menos algumas coisas não tinham desaparecido e eram úteis. Não teria que desperdiçar seu tempo dando explicações inúteis sobre quem era.

_ (Gasp!) P-perdão, senhor... Não pensei...

_ Isso é até normal, já me acostumei – o mendigo fez um gesto impaciente, exigindo silêncio, e então apontou para o homem caído com sua própria pistola – Este sujeito é o último dos sabotadores, acredito, mas é melhor que destaquem a milícia para uma inspeção detalhada ao sistema de vapor. Não podemos correr riscos.

_ Entendido, senhor!

_ E diga que dei ordens para que a milícia se mova, ao invés de ficarem amontoados feito umas comadres nas muralhas olhando para a movimentação lá embaixo. Se aquelas coisas lá no vale se dispuserem a atacar a Avançada, é melhor que estejam fazendo algo mais útil do que ficarem encarapitados em cima dos muros.

_ S-sim, senhor. Mas...

_ E, principalmente – ergueu a mão direita, novamente conseguindo silêncio – Estou dando ordens claras para despacharem os sete comandantes dos Dragões lá para baixo. Podem deixar a corporação protegendo a Avançada, mas quero os líderes dando apoio a um Escavador chamado Zero lá embaixo, na Sucata.

_ Hein? Os Sete Dragões? Mas senhor...

_ Não tá aberto à discussão, soldado – o velho mendigo bateu na cabeça do rapaz com impaciência – Vai logo fazer o que eu mandei! É uma ordem!

Apalermado, o soldado ainda olhou uma última vez para o velho, para o corpo no chão e de volta para o velho antes de sair correndo. O velho abanou a cabeça em negativa; talvez devesse começar a se preparar para fugir de lá, se toda a milícia era composta de gente confusa como aquele garoto.

Longe dali, Christabel já não sentia dor. Por teimosa e resistente que fosse, havia um limite para quanta dor seu corpo podia suportar em estado de plena consciência, e ela agora se retirara para dentro de si mesma, buscando fugir da agonia da dor. Longe de conforto, no entanto, a inconsciência trouxe a ela um novo tipo de tortura.

O cenário mudara para algo que ela reconhecia bem; a carruagem que transportava a ela, sua mãe Reiko e seu pai Kane na última noite em que estivera com eles. O som das rodas de madeira sobre a terra, os cascos dos cavalos e o som mais afastado de trovões. Ela estava muito inquieta.

A mão de sua mãe passou sobre seus cabelos, afagando sua cabeça e Reiko sorriu para a filha. Christabel achou estranho não conseguir se lembrar claramente do rosto da mãe, rosto de alguém vindo das terras mais distantes do Oriente, exótico e que despertava atenções por onde Reiko fosse. Mas nunca poderia esquecer o sorriso da mãe para ela; era como um tesouro que guaradava.

Também lembrava-se bem da presença do pai, Kane, embora não se recordasse claramente de seu rosto. Os cabelos do pai eram brancos, até onde ela lembrava, mesmo ele não tendo sequer alcançado a meia-idade. Um homem sério, ela lembrava-se dele como sendo chamado de ‘o mais forte espadachim da fortaleza’. E ela lembrava-se dele tomando decisões, também; era simplesmente impossível sentir-se em perigo enquanto Kane estava por perto.

Desta vez, no entanto, havia uma intuição com ela. De antemão Christabel sabia que algo iria acontecer, algo que já vivera várias e várias vezes, mas não conseguia transformar aquele conhecimento pessoal em uma coisa que pudesse comunicar aos pais. Havia a música temível à sua volta num crescendo, cada vez mais intensa enquanto ela tentava atinar com o motivo para sua inquietude.

O momento da explosão, ela não recordava bem. Como fora causada, ela não sabia até então. Só o que estava muito claro em suas lembranças era sua mãe se pondo dolorosamente de pé ao lado dela, enquanto Kane também se erguia e ficava entre as duas e... os cinco cavaleiros no horizonte.

Christabel não conseguia divisar muito bem quem eram eles, mas os vultos imponentes de quem a música parecia emanar estavam marcados a ferro e fogo em sua memória, assim como a presença avassaladora deles. Seu pai era um homem forte, ela nunca esqueceria isso; mas a força daqueles cavaleiros estava muito além dele. E eles estavam ali por ela, sabia.

No mundo fora das lembranças de Christabel, Dirceu e Antônio viam a tiara começar a centelhar muito e o velho Escavador preocupou-se. Aquilo ia além de tudo o que pudesse ter antecipado, e ele temeu pela vida da Rainha. Antônio Matogrosso parecia ainda mais surpreso ao medir os níveis de energia.

_ Isso... tem alguma coisa errada, Dirceu! O metal... Eram as jóias que deviam coletar a carga! O que foi que...?

_ ... O ponteiro, o que está indicando?

Antônio não entendeu mas voltou-se, checando os picos novamente e murmurando:

_ Estranho... Pra a carga, começamos com nível sessenta e cinco, menos da metade da capacidade máxima. Mas... é como se estivéssemos recebendo nível setenta e oito dela! Tudo bem, eu sei quem ela é, mas pelo que você descreveu, ela não devia emitir coisa nenhuma até tirarmos a tiara. Não entendo...

Dirceu ficou em silêncio por um momento, contemplando o rosto de Christabel. Não sabia pelo que a menina podia estar passando, não sabia até quanta energia poderiam injetar no metal sem que fosse arriscado para ela... não era um médico. Era um Escavador, e mecânico. Então, pedindo silenciosamente ao filho e à moça que o perdoassem, tratou o problema como um desafio de mecânico.

_ Antônio, dê uma queda na carga pra cinquenta, e depois suba de novo. Aumente a saída pra oitenta, e fique de olho no manômetro.

Antônio olhou de volta para o colega, como se para ter certeza de que aquilo era sério. E Dirceu voltou-se para ele com impaciência.

_ Ande logo! Vamos reduzir a resistência do material e depois tentar suplantar a saída de força dele com mais força. A idéia é saturar as jóias da tiara por tempo suficiente para que seja removida; é nossa melhor chance.

_ Dirceu, ela é um ser humano... Não usamos oitenta em nada menor que um motor de caminhão.

_ Um motor de caminhão nunca tentou resistir ao reparo – Dirceu retrucou impaciente – Vai fazer, ou vou ter que ir até aí mancando? Vai demorar mais!

_ Droga, Dirceu – Antônio parou de discutir. O velho Dirceu tinha uma intuição acertada quanto aos reparos que faziam, mas nem ele era infalível. E estavam lidando com uma vida – Tomara que saiba o que tá fazendo.

_ Também acho – Dirceu murmurou.

Sunday, July 23, 2006

Eaê, manos, qual que é a treta? Numas de Homem Cueca, saudações do Louco!

O quê? Vocês não acharam mesmo que a Christie ia tentar fugir sem tirar aquele treco da cabeça? Ou que o Zero e o pai dele iam vacilar?

Bom... *dando de ombros* Cada um se vira como pode nos trinta. E esses são os trinta do Zero.

Enquanto isso, Christie se arranja como pode.

Forte amplexo!

(...)

Subiram depressa por meio de um elevador, com Laírton ao lado dela o tempo todo murmurando suas orações, das quais ela não podia ouvir as palavras. Quando chegaram à sala de operações no entanto ele deteve-se à porta, e Dirceu explicou às pressas que o Irmão poderia entrar se quisesse, mas Laírton negou-se.

_ Pretendo isolar toda a sala onde estarão. Será melhor se eu permanecer aqui fora.

E tornou á sua oração, deixando-os enquanto a porta se fechava, e Christabel aborreceu-se consigo mesma por perceber algum desapontamento em suas reações; esperava, agora sabia, que ao menos algum de seus (amigos) companheiros de viagem estivesse com ela naquele momento. Não seria possível, era só... mas ela não conseguia pôr de lado seu desapontamento com isso.

_ Deite-se, por favor, Majestade – Dirceu passou por ela, mostrando uma mesa no meio da sala – Isso deve nos tomar pouco tempo... mas é recomendável que nos apressemos. João, como está?

_ Tudo pronto por aqui, Dirceu – um outro homem, com um porte físico que faria Christabel pensar em mais um dos ‘macacos’ lá embaixo ao invés de um dos melhores pesquisadores da Avançada – Cadê o seu filho maluco?

_ Acredite, é melhor não saber – Dirceu coxeou até um dos instrumentos instalados numa parede aos fundos, algo que para Christabel parecia-se com uma estante de metal cheia de ponteiros – Já abasteceu o sistema?

_ Está aquecendo; vai estar pronto num minuto. – a voz dele pareceu alterar-se para um cansaço divertido – Seja o que for que trouxe, é algo que está dando muito trabalho. Espero que não volte atrás na promessa.

_ Não precisa se preocupar – a voz de Dirceu também soou divertida – Não acho que ela vai querer guardar essa coisa nem mesmo como lembrança. E eu não teria o que fazer com uma tiara de arcânio e Dragão de Fogo lá em casa; é toda sua.

Christabel podia ouvir os passos dos dois homens pelo compartimento. Sua consciência estava curiosamente alerta a tudo à sua volta, mesmo sendo restrita pela tiara. Na sala contígua havia mais quatro pessoas, aproximadamente; podia perceber a proteção de Laírton recobrindo a sala onde estava, sem poder deixar de admirar-se de que a vontade e a fé de uma única pessoa pudessem encobrir sua presença para todos os sentidos daquela maré que se movimentava lá fora; podia ouvir a música terrível parecendo mais alta além dos muros, enquanto lhe parecia que a torrente de perseguidores alcançaria e passaria pela cidade a qualquer momento, sem poder localizá-la...

... e mesmo isso não conseguia desviar sua mente do que devia estar acontecendo com os demais lá fora. A música, eles estavam indo na direção dela, e não o contrário. Devia estar louca quando
aceitara aquilo, pressionada pelo tempo ou não. Eles não teriam qualquer chance de vitória sem ela...

_ Concentre-se, menina.

Christabel saiu de sua divagação ao notar que o Velho Dirceu estava ao seu lado, olhando para ela com ar sério. Achou perturbador não ter percebido quando ele se aproximara.

_ Eles ficarão bem; você tem seus próprios problemas para lidar agora. Desligue-se e se concentre em isolar o que vai sentir, porque isso deve doer.

_ É o seu filho lá fora.

Ela não entendia como ele podia estar melhor controlado do que ela própria quanto ao destino do grupo chamariz quando o único filho dele os liderava. E Dirceu acenou afirmativamente.

_ É, é o meu garoto, mesmo. Por isso estou me concentrando no que devo fazer; quero terminar isso o quanto antes para que vá ajudá-lo.

Ela olhou para ele em silêncio. Mais e mais, aquele velho tolo conseguia subir no seu conceito, mesmo com sua aparente indiferença quanto a ela. Dando um sorriso um pouco contrariado ao reparar na expressão dela, Dirceu acenou com a cabeça e comentou:

_ O dever de uma Rainha é zelar pelos seus súditos, tenho certeza de que sabe disso. Seu reino não está entre as paredes de uma fortaleza ou num território, no entanto; se compõe exclusivamente das pessoas, daqueles que a protegem e que deve proteger. Nunca se esqueça disso, Majestade. Ser a servidora suprema, usando as algemas de sua posição, até que não esteja mais apta a fazê-lo.

_ Devo fazê-lo até o fim de meus dias – Christabel retrucou com alguma tristeza em sua voz. E Dirceu retorquiu:

_ Até que não esteja mais apta a fazê-lo. Vai saber se tal hora chegar e, acredito, vai agir de acordo com a necessidade.

_ Dirceu, tudo pronto aqui – o Dr. Matogrosso sinalizou – Podemos começar a medir o nível de carga quando quiser.

_ Muito bom. Acho que ela também já está pronta – piscou para Christabel – Você é durona, já sei. Mas tente relaxar um pouco. Pode ser que sinta menos a dor dessa vez se fizer isso.

Do lado de fora da porta, Laírton estava entregue às orações. Entre as palavras antigas numa língua que poucos no mundo atual conheciam, ele também entremeava algumas recriminações inevitáveis ao seu Senhor, reclamando que entendia a necessidade de esforço e provação, mas que aquilo já começava a parecer exagero até mesmo aos olhos dele, um servidor vitalício. E ainda estava falando nisso quando sentiu a grande onda de tormento que vinha de Christabel. Era incrível a força daquela dor, e o poder que vinha dela em protesto. Talvez pela restrição da tiara, ele ainda podia mantê-la oculta apesar de tudo, mas aquilo só vinha para colocar mais reclamações em sua oração:

_ Torno a dizer, deixo bem claro o meu desagrado no que diz respeito ao sofrimento que eles devam sofrer, Senhor. Principalmente essa menina. Até quando Christabel deverá sofrer em nome dos outros? Será realmente tão hediondo o que ela já fez que mereça tamanha punição? Rogo ao Senhor, me auxilie a mantê-la oculta por mais tempo, pelo tempo que for necessário, até que ela possa cuidar de si mesma, e então possamos auxiliar de forma mais direta nossos companheiros em necessidade. É verdade que ela se considera acima de qualquer ajuda, ou era o que parecia, mas ainda assim eu rogo para que continue ao lado dela. Christabel já começou a perceber que precisa do auxílio de outros. Em nome desse aprendizado, eu rogo ao Senhor, não faça com que ela perca novamente tal confiança, que foi cultivada com tal sacrifício por pessoas de boa intenção e atitude...

E assim continuou a conversa. Laírton tinha muito a dizer, e muito a fazer também. E mesmo enquanto falava, sem perder o fio da meada, podia sentir claramente a presença das criaturas fora daquela sala, e uma outra ameaça, mais próxima. Algo pequeno, impossível para que ele definisse, mas fixo demais para que ignorasse. Seria possível que a provação chegaria a tal ponto? Não havia mais nada humanamente possível para ser feito, o que mais o Senhor podia esperar deles?

Christabel estava tendo a resposta para aquilo dentro de sua sala. Dor após dor ela sentia, apesar das palavras de Dirceu e suas tentativas de minimizar a dificuldade para ela, sua consciência estava toda centrada nas sensações terríveis do metal das máquinas no metal de sua tiara.

E sentiu um alívio pequeno chegando, enquanto uma sensação da mão de alguém em seu ombro pareceu reduzir o tormento. Mas, se os outros estavam lá fora, e as pessoas ali dentro operavam máquinas, quem...?

O Capitão Marco, da Fortaleza de Melk, estava de pé ao seu lado. Talvez um espírito não tivesse muito a dizer em tal situação, mas tal não era necessário. A atitude de Marco era clara, ele pretendia protegê-la da dor tanto quanto pudesse, e sem dúvida, estava aliviando o sofrimento de Christabel com sua presença.

Mas o olhar dela para ele também foi claro o bastante; não o queria ali. Havia outro lugar onde ele poderia ser ainda mais útil, e aquela era a batalha que ela deveria travar. Que ele auxiliasse quem realmente necessitava; ela estava deitada, a única do grupo que viajava que realmente não estava se esforçando.

A expressão de Marco foi velada, claramente em desacordo. Talvez ela não estivesse se movendo, mas estava batalhando tanto quanto qualquer um dos demais. Se ele podia ajudar de algum modo...

Mas a expressão dela ficou ainda mais grave: aquilo não estava aberto a discussão. O dever dele podia ser para com ela, mas ela decidia como seria cumprido. E ela não o queria ali; Daniel, Melissa, a caçadora e Zero precisavam muito mais da ajuda que ele pudesse dar-lhes do que ela própria. Que se fosse, então.

E Marco curvou-se, e se afastou em seguida. Se Christabel ordenara que fosse para a frente de batalha, ele o faria. Da forma como pudesse. E auxiliaria os demais a aguardar por ela.

Ao mesmo tempo, em outro lugar, uma figura encapuzada aproveitava a confusão para seguir despercebida rumo a uma das válvulas do controle central de vapor. A iluminação da Cidade Avançada e outras funções autônomas como o abrir de portas pesadas e certos mecanismos imensos funcionavam por meio do mesmo sistema. Aquilo era o ápice da reconstrução no mundo moderno, o mais próximo possível naquele momento dos sistemas automáticos de quando a eletricidade em máquinas ainda funcionava. Era também um dos grandes orgulhos da Avançada, tanto que os cientistas e inventores ali aceitavam pagar o preço do grande risco envolvido naquele projeto.

Se por um lado o sistema de vapor lhes dava um ar impressionante de modernidade, por outro colocava a cidade inteira em risco, tornando-a em algo semelhante a uma imensa bomba de vapor. O aumento súbito ou a falta de liberação do vapor excessivo em períodos controlados rigorosamente arriscava toda a obra a um fim desastroso numa grande explosão. Os testes com os mecanismos de vôo tinham sido transferidos para um descampado próximo desde o último incidente, o que fizera Zero ganhar sua Unicórnio, pois o temor de uma perfuração em um dos tanques de vapor concentrado passou a preocupar os cientistas da Avançada.

O vulto encapuzado, no entanto, comprara seu acesso até ali, bem como seus companheiros. Seis ao todo, eles tinham uma missão a cumprir, que poderia muito bem ser um suicídio. Agora que a feiticeira chegara até ali, havia muito pouca dúvida de que seria capaz de se restabelecer e voltar a Melk com seus plenos poderes. E isso era totalmente contra a ordem que tinham recebido de seus líderes, que eles não sabiam já estarem mortos. A única coisa que realmente importava era que cumprissem o que lhes tinha sido ordenado; impedir Christabel de regressar ao seu lar, pouco importando como o fariam.

O vulto conferiu o horário. Não poderia se demorar mais; seus colegas já deviam estar em posição. O suborno para que os verdadeiros responsáveis pela pressurização deixassem seus postos fora alto, e dois deles não o haviam aceito. Bem, o problema fora contornado de qualquer forma, e ninguém deveria descobrir quando a Cidade Avançada se fosse. Era de se esperar que, por poderosa que fosse, Christabel ainda fosse humana o bastante para morrer diante de tamanha explosão. Ao menos, não retornaria para Melk.

O encapuzado olhou fascinado para os números do manômetro, o ponteiro oscilando tranquilamente dentro de seus números de nível normal a baixo. Aquele era um horário tranquilo, muita coisa da Cidade Avançada podia ser feita sem iluminação extra, então não havia muito uso para o sistema de vapor naquela hora. Seus colegas espalhados nos pontos de junção já deviam ter começado àquela altura; era a sua vez. Lacrando a passagem de vapor na junção principal, e depois arrancando dali a válvula reguladora, seria impossível para que a pressão excessiva fosse controlada, mesmo que alguém pudesse notar o que fora feito com aquela interessante procissão de criaturas passando diante de suas muralhas. Ele começou a girar a válvula...

_ Tá, tudo bem, agora sai daí rapidinho, e com as mãos à mostra.

O encapuzado voltou-se. A pouco menos de dez passos dele, um velho mendigo estava de pé, um tipo de martelo em sua mão direita voltado para baixo e com seu flanco esquerdo voltado para o encapuzado. O homem hesitou, como se não soubesse se devia entender aquilo como uma ordem ou se era apenas o delírio de um bêbado.

_ Te garanto que falei muito sério, seu abusado – o mendigo replicou, apertando o cabo do martelo na mão – Minha aparência e meu cheiro podem não ser dos melhores, mas o que você queria fazer... Isso é muito mais fedorento do que eu. Sai... daí... agora!

O encapuzado lentamente deu um passo para trás, e depois outro. A posição ainda não era muito boa, era preciso que ganhasse tempo. Por natureza, ele preferiria não ter que causar mais vítimas do que o necessário, mas já tinham ido longe demais para se deter por um velho mendigo.

_ Não sabe o que está fazendo... Isso precisa ser feito!

_ Destruir uma cidade inteira precisa ser feito? Tem razão, eu talvez não saiba o que tô fazendo – fungou, esfregando o nariz com a mão direita – Mas você tá latindo de louco! E eu tenho certeza de que a milícia da Avançada vai querer saber dos seus motivos.

_ ... A bruxa... – o encapuzado rosnou – Ela veio até aqui, e eles a acolheram. Não são tão bondosos quanto você pensa...!

_ Sinceridade? Não quero saber dos seus problemas com a Rainha, não. É, eu sei um pouco mais deles do que você pode pensar, moleque, mas não concordo com essa política de ‘cortem a cabeça pra salvar o corpo’, não. Principalmente quando um bando de imbecil resolve que um genocídio é a melhor maneira de cortar a cabeça. Andando!

O encapuzado, ao menos, conseguira tempo para o que pretendia. Sua mão esquerda conseguira descer até sua cintura, onde uma adaga longa estava presa, e ele era incomparável como atirador de facas. Poderia atingir uma mosca pousada numa parede escura, diziam, se pusesse as mãos em sua adaga... e acabara de fazê-lo.

Sunday, July 16, 2006

Senhoras e senhores, bem vindos ao blog 'Christabel'. Eu sou o seu anfitrião, Loucomon, e vou contar mais o pedaço de hoje.

E aí, alguém entendeu o q foi feito? Do que o Ahl-Tur tava falando? E por que o Zero se aborreceu?

Bem, se não entenderam, na boa. Vai aí a explicação ^^

Forte amplexo anfitriônico!


XXVI – Revelando Verdades



_ Hã... – Zero arriscou um olhar de relance para a moça atrás de si – E se eu te disser que ela tá aqui, bem atrás de mim, e você não tá vendo?

_ Poupe-me de jogos – Tur retrucou de mau modo – Meu tempo é curto, e não pretendo desperdiçá-lo com você mais do que for necessário.

_ Mestre Tur, do que está falando? – um dos Arcanos aproximou-se, sem entender – A Rainha está bem diante de nós! O poder dela...

_ Um engodo engenhoso, apenas isso – Tur interrompeu sem tirar os olhos do rosto de Zero – De algum modo, ele duplicou o poder de Christabel e o transferiu para outra pessoa. Nos fizeram correr atrás deles, e também a todos esses tolos à nossa volta. Simples, e no entanto brilhante. Sem vestígios da verdadeira Rainha, com um sinal dela se afastando depressa, a conclusão óbvia era de que ela estava tentando escapar. E se alguns dos perseguidores lutassem entre si, os demais não teriam porque cogitar que estavam correndo atrás do alvo errado.

Os oito Arcanos se voltaram para as duas figuras diante de si. Havia uma superioridade sorridente no rosto de Zero e, por um instante, ainda viram a espadachim atrás dele como a haviam imaginado.

E então perceberam, como se nota o truque de um mágico quando alguém revela como foi feito: o poder da vida de ‘Christabel’ não oscilava com a chama da vida que todos os seres vivos tinham. Na verdade, havia uma oscilação vital naquela moça, mas parecia mover-se diante de um fundo pintado, o padrão da Rainha colocado nela de algum modo. E embora aquele manto tivesse realmente o cheiro de Melk, possivelmente de Christabel, havia um segundo cheiro vindo de suas demais vestes. Um cheiro diferente daquele que procuravam. Mas, se era assim...?

_ A verdadeira Christabel está oculta da nossa percepção por algum tipo de barreira – Tur antecipou-se à pergunta seguinte – Em uma das aglomerações de humanos aqui perto, provavelmente... ou talvez, eles tenham sido previdentes o bastante para removê-la. Ela talvez esteja em movimento, se afastando enquanto perdemos tempo. Tempo precioso que seria necessário para vasculhar nas cidades próximas, tempo que ela pode usar para desaparecer novamente. A não ser que nossos amigos aqui nos falem sobre a barreira que a oculta, e como poderemos rompê-la.

_ Sei – Zero tornou com pouco caso – E que tal se eu te mandar morder seu pai na bunda?

_ Maldito, não zombe de nós! – outro dos Arcanos falou, sendo contido por Kayla – Mestre Tur já revelou seu plano, sua farsa agora é inútil!

_ Muito pelo contrário, Tarek – Kayla disse, os olhos pousados em Zero com alguma admiração – Ele está ganhando cada segundo que pode, permitindo que sua Rainha se oculte de nós. Não é isso, humano?

_ O nome é Zero, morceguinha – Zero voltou os olhos para Kayla por um instante, e depois de volta para Tur, diante dos outros – E isso é tudo o que eu tinha pra contar. O papo acabou.

_ Ah, eu acredito que ainda não.

Os Arcanos se moveram, todos ao mesmo tempo. A mão de Zero estava a postos, pronta para agarrar a Marcadora. Encontrava o alvo sozinha, seu pai dissera. Talvez precisasse, de fato. E o vento começou a soprar poeira sobre ele e sua parceira enquanto eles recuavam devagar, e os Arcanos começaram a se aproximar lentamente, formando um anel ao redor deles.

Talvez seus pensamentos tivessem voltado no tempo então, quando acabara de se decidir pelo que faria, e comunicara sua idéia aos amigos. Eles haviam aceito sua idéia sem sequer saber bem o que seria, todos. Christabel foi a única a desaprovar aquilo por completo, e uma vez ao menos ela não o fez com o ar de desdém de sempre.

_ Idiota, você perdeu completamente o pouco juízo que já teve? Vocês não vão sobreviver! Não há como escapar!

_ A idéia não é escapar, Christie – Zero explicou com alguma pressa – Só vamos ficar enrolando aqueles otários lá fora até meu velho conseguir arrancar esse negócio de você. E, Seu Dirceu, é melhor fazer isso rápido, hein? Não dá pra saber quanto tempo a gente aguenta lá fora.

_ Isso não vai funcionar! – repetiu Christabel – Eles todos estão perseguindo a mim, vocês não vão conseguir enganá-los!

_ Ah, vamos sim. Li, me empresta o Escudo um pouquinho?

Melissa retirou a braçadeira Escudo e passou a Zero, que a colocou em Sari. Ao fazê-lo, ele ainda olhou para a amiga caçadora e perguntou:

_ Escuta, você quer mesmo fazer isso? Vai doer pra caramba, você viu como foi ontem.

_ Estamos perdendo tempo, Zero. E você sabe que não tem outro jeito.

Ele sorriu, um pouco mais tristemente agora. Sim, claro que sabia. E voltou-se para Christabel.

_ Christie, o truque é esse: Sari falou da sua força, de que ela pode ficar impressa em uma jóia preparada pra receber, como é o caso da que meu pai colocou no bracelete da Melissa. Isso deve servir pra enrolar os otários lá fora, ao menos por algum tempo, se a gente fizer você ‘sumir’. É aqui que você entra, Laírton – voltou-se para o Religioso – Consegue formar uma proteção ao redor da Christie pra apagar a presença dela por algum tempo?

_ Sim, acredito que seja capaz disso, Zero – Laírton pareceu perturbado – Mas terei que permanecer próximo a ela, me concentrando em manter a ocultação, e sem minha ajuda lá fora...

_ Sem sua ajuda aqui dentro, nem temos porquê sair – Zero o interrompeu – Você vai ser parte vital disso, Irmão. Mas tem a ver com ficar pra trás.

Laírton não respondeu. Não era preciso, ele já dissera que aceitava. Mas preferiria correr o risco com seus companheiros, como todos eles. E Zero voltou-se novamente para Christabel.

_ Essa é a parte ruim, menina: vamos ter que forçar sua tiara um pouco. Você não vai conseguir colocar o bastante de força dentro do Escudo da Melissa pra enganar aqueles otários lá fora se não for assim. Também vai ter que emprestar seu manto de viagem pra a Sari, pra disfarçar o cheiro dela; ela acredita, e me convenceu, de que tem bicho lá fora que pode perceber a diferença pelo faro.

_ Não seja idiota – ela retrucou – Não vou tomar parte disso! Não concordo!

_ Quer parar de encher o saco?!

Christabel recuou, e a surpresa em seu rosto foi compartilhada por todos, exceto Dirceu, que também olhava para ela com seriedade e alguma impaciência. Mas fora Zero quem falara.

_ Não percebeu ainda? A gente não vai ter como segurar todos esses caras lá fora, Christie! Não vai rolar! Você viu o que aconteceu ontem, aquele cara invadindo o sono de todo mundo na Sucata, e era um só! Agora vai vir gente de tudo o que é lado; acha que eles vão pegar leve com a Avançada só porque tá no alto do morro?

Ela não respondeu. Os invasores provavelmente teriam receio de ferí-la, ela era o alvo do ataque afinal. Mas sem dúvida não teriam qualquer escrúpulo com quem estivesse próximo a ela e, para procurar numa cidade tão grande, a melhor maneira era tirar os empecilhos do caminho. Ela voltou-se para Dirceu.

_ Disse que esta cidade tem seus meios de defesa.

_ Sim, eu disse. Mas é verdade que será mais simples trabalhar sem perturbações, uma coisa que não será possível com um ataque sobre a Avançada.

_ Eu não espero que você fique quietinha esperando as coisas acontecerem, menina – Zero tornou a sorrir para ela, o mesmo ar resignado de antes – Tô contando com você pra ajudar a gente lá fora, sim. Mas sabe tão bem quanto eu que não temos a menor chance se você não arrancar esse treco da sua cabeça. Ou morremos todos e eles levam você, ou arriscamos uma enganação lá fora enquanto meu pai tira essa coisa.

Ela entendeu a escolha dele, então. Contava com ela para ajudá-lo na batalha, mas para tanto sabia que ela precisaria de sua plena força. E estava arriscando a si mesmo, e a todos os companheiros... até mesmo sua cidade e seu pai... para dar-lhe o tempo de que precisava.

_ Como sabe... que não vou fugir depois? – ela perguntou, se esforçando para dizer as palavras.
Sabia que o tempo era curto, mas tinha que entender – Uma vez recuperada... posso partir quando quiser.

Zero surpreendeu-se por um instante; não esperava ouvir aquilo. Mas sorriu mais abertamente enquanto os demais olhavam para ela como se perguntando se ela seria capaz mesmo de tal.

_ Nah, duvido. Você ainda me deve um chute, lembra?

Christabel ruborizou. Não tinha como evitar isso; como aquele idiota se lembrava de tal coisa... e num momento daqueles? E, como podia fazer todos os outros se voltarem para ela com aquele ar de pergunta nos rostos? Sacudiu a cabeça, olhos baixos, agarrando o pulso de Sari para desfazer o rosto vermelho, e sem conseguir. Ao deparar com a pergunta que persistia no rosto da caçadora ela meramente disse:

_ Prepare-se. Será doloroso.

E antes que alguém pudesse oferecer alguma ajuda ou até que Dirceu lhe desse algum instrumento para tal, ela agarrou a própria tiara e fez força para retirá-la. No ato, a dor de ter seu crânio fendido percorreu toda a consciência da Rainha e de Sari, em contato com ela.
Temendo que não fosse o bastante, Christabel tornou a puxar, mas era tudo o que podia fazer por vontade própria, e ela e Sari se separaram um instante antes de Zero vir ampará-la.

_ É, valeu, acho que isso já deve ter dado. Sari, você tá legal?

_ Acho... que sim, Zero – Sari afastou-se, indo até a Unicórnio e dando-lhes as costas – Vamos; estamos perdendo tempo.

_ Tudo bem. Pai, agora é com você – Zero voltou-se para o pai – Leva a Christie pra dentro e agiliza, Velho Dirceu. Tamos contando com você.

_ Se cuida lá fora, menino – o pai sorriu para ele – E veja se corre bastante.

Zero sorriu, se inclinou e beijou a fronte do pai. Quando se afastaria, no entanto, Christabel segurou seu pulso por um momento. E mediante o olhar surpreso dele, ela disse:

_ Provou que pode manter sua promessa. Agora, quero que se mantenha vivo.

Ficou profundamente surpreso. E também feliz ao ouvir aquilo dela. Apertando a mão dela que o segurava, ele respondeu:

_ Até mais, Rainha.

Foi quando eles tomaram o veículo de Éderson, colocaram a Unicórnio a bordo e dispararam na direção do Grande Cabo, Zero no volante acelerando como nunca o fizera antes. E eles tinham irrompido pelos portões ainda abertos e desavisados da Cidade Sucata como uma avalanche, enquanto Christabel fora levada para cima sem qualquer olhar ou palavra para outra pessoa. Podia ouvir a música terrível de novo, baixa, mas se aproximando... e pela primeira vez em muito tempo, sentiu medo de não tornar a ver uma pessoa.

Sunday, July 09, 2006

Oi gente blogueira! Saudações do Louco!

Vou te contar, começou a chover e dar relâmpago, então vou abreviar hoje. Vejam o q acontece qdo se mistura nove Arcanos com dois fugitivos... e uma surpresinha ^^

Amplexos!

(...)

Havia um temor profundo se espalhando por toda a parte. Mesmo que os Nove Arcanos não fizessem uso de sua Escuridão, a mera presença do poder contido em seus corpos já bastava para intimidar as demais espécies. Era a aproximação deles que Sáurio sentira ao farejar o vento. Servidores mais próximos Daquele que Se Fora, exilados com ele, seu poder vinha de uma fonte anterior e maior do que os mais antigos entre as espécies do mundo.

Ahl-Tur liderava seu grupo, seguindo a magia que brilhava para os sentidos deles como um farol na escuridão. Ela não podia escapar a eles daquela vez; mal fora capaz de enfrentar a ele sozinho, não tinha como vencer os nove ao mesmo tempo.

Pousaram nas proximidades de onde podiam sentí-la em formação perfeita, o líder primeiro e os outros logo em seguida. A força dela estava ali. Sem dizer coisa alguma, Ahl-Tur avançou devagar na direção dela, seus Arcanos o seguindo. E quando se deteve a pouco mais de dez metros de onde ela estava, eles o imitaram.

Havia alguém entre eles e ela. Era alguém que ele já conhecia, um humano que já vira antes. Ele estava numa postura aparentemente relaxada, a espada longa voltada para baixo na mão direita e a esquerda aberta, separada do corpo. Era o lado esquerdo do corpo que estava voltado para eles, também, e o rosto trazia um ar de cansaço resignado. Mas também um sorriso, que ficou evidente em sua voz quando o saudou.

_ E aí, Guarda-Chuva, firmeza? Já faz algum tempo, hein?

Tur não precisava se voltar para saber que seus companheiros todos estavam consternados com a atitude dele; o mesmo se dera com ele próprio quando se encontrara pela primeira vez com Zero.

A figura atrás dele, era quem os conduzira até ali. Podia sentir o poder glorioso de Christabel vindo dela, e também podia sentir o cheiro dela no manto que usava, mesmo que não pudesse ver seu rosto oculto sob o capacete. Ela mantinha a mão sobre o punho da espada, pronta para atacar, mas era claro para os nove que antes de chegar a ela, teriam que passar por aquele imbecil em seu caminho.

_ Bem vindo à minha cidade – Zero prosseguiu, no mesmo tom de voz – Bom, não bem aqui, claro, isso aqui são só os arredores. Mas é praticamente a mesma coisa, se for pra ver o quanto cê viajou desde Melk. E trouxe a família, também! Fizeram uma boa viagem?

_ Afaste-se.

_ Não.

O tom divertido em sua voz se mantinha, mas seus olhos escureceram, fitando Tur. Ele parecia realmente acreditar que tinha alguma chance de lutar contra eles, e isso aborreceu aos demais Arcanos com Tur. Kayla principalmente, que rosnou:

_ Isso já é abuso demais...! Milorde Tur, devemos...

_ Cale-se, Kayla. Para trás!

_ Mas, Mestre Tur, hesitar diante de um...

_ Perdeu sua audição, fêmea? – Tur não se voltou, mas seus olhos frios caíram sobre Kayla – Mandei se afastar!

Kayla recuou contrariada, e também intrigada em seu íntimo. Tur não tivera qualquer receio em forçar sua opinião diante do próprio mestre deles; por quê estava hesitando diante daquele humano? A litania formada em sua mente pela recomendação dele, Não subestimem os humanos, apenas servia para aborrecê-la mais.

Tur também estava aborrecido, mas alerta. A negativa de Zero o perturbara porque esclarecia mais do que o outro pensara. O humano diante de si não tinha qualquer magia própria, não mais que a própria força vital. Não tinha qualquer proteção especial, tampouco, nada para mascarar suas intenções para os sentidos deles. E era isso mesmo o que deixava transparecer uma certeza aterradora, que ele não conseguia compreender: Zero sabia que não tinha qualquer chance de derrotar a todos os Arcanos ali reunidos, e no entanto, tinha plena confiança de que seria capaz de abater a maioria deles no momento em que se aproximassem. Ele próprio incluso, caso se atrevesse a tal.

E era isso que o perturbava. Não havia nada ao redor dele que pudesse dar-lhe tamanho poder além de Christabel, e ela não parecia mais poderosa do que já fora. Muito ao contrário, ele observou com curiosidade, a força dela parecia incomum. Não oscilava corretamente, como faria o pulsar de sua vida, como fazia a força de cada ser vivo. Até mesmo aquele tolo diante dela, a chama da vida dele tremeluzia como uma vela, enquanto a dela parecia-se com uma grande fogueira... e então ele compreendeu.

Os demais Arcanos não compreenderam quando a atitude toda de seu líder mudou, da hostilidade óbvia para o relaxamento. A espadachim atrás de Zero apertou mais o cabo da espada, temendo o pior. E o rosto do mecânico expressou ainda mais cansaço ao entender o que se passara.

_ Praga...

_ Muito astuto, sem dúvida. Simples, mas eficiente. Dou-lhe os parabéns, rapaz, pela idéia e pela coragem. Agora, diga-nos onde está Christabel.

Monday, July 03, 2006

Olá leitores! com um atraso de quase vinte e quatro horas (pouco mais ou pouco menos, acho), saudações do Louco!

sim, tá na hora de continuar. Tá na hora de descobrir o q catzo aconteceu com o Zero e a sua protegida. E tá na hora de rever um velho conhecido ^^

Amplexos escritores (e meio vagaus) do Louco


(...)


A cabeça estava girando, os pensamentos confusos lutando para se organizar. Felizmente, a urgência de sua missão vinha adiante para servir de ponto de apoio: precisava manter os perseguidores longe de Christabel. Por isso saíra de sua cidade naquela corrida insana sobre a planície. E a força dos pensamentos o ajudou a suplantar as sensações de ardor e contusão nos braços, pernas e tronco. A cabeça fora protegida do pior do tombo pelo capacete, mas o visor agora estava trincado.

Removeu o capacete. Muito melhor; podia ver e ouvir com clareza à sua volta, e imediatamente puxou a espada larga da bainha. Jogou-se para a direita enquanto cortava, e algo foi atingido por ela, tombando no solo. Droga, não podia vacilar ali! E onde estava...?

Sua protegida estava a poucos passos adiante. Devia imaginar; mesmo naquela velocidade, seria preciso mais que um tombo de motocicleta para deter aquela menina. O capuz de seu disfarce caíra, mas continuava protegida por seu próprio capacete, então não havia maior preocupação. O problema era a figura imensa assomando sobre ela, uma imensa espada de lâmina curva desembainhada. Uma figura que já conhecia... e que não poderia ter aparecido em hora pior, ele pensou enquanto ouvia o que o outro estava falando.

_ ... astuta, sem dúvida, Christabel, mas finalmente se deixou apanhar. Sáurio não vai permitir que lhe escape novamente.

Não havia nada para ser dito em resposta, ao que parecia. A fugitiva meramente se moveu para o lado num passo lento, a própria espada fora e esperando, procurando o espaço para atacar. Não poderia descuidar do inimigo diante de si, mas também precisava manter a atenção por toda a volta, pois os perseguidores continuavam se acotovelando para chegar a ela.

Sáurio também estava ciente disso. Ele era um alvo ainda mais fácil, tanto pelo tamanho quanto pelo fato de que, quanto a ele, os demais perseguidores não teriam qualquer escrúpulo antes de matar. Tanto que seu primeiro movimento no duelo não foi contra Christabel, e sim um corte amplo para o lado, voltando-se para atingir um Lobisomem que saltara silenciosamente por trás dele. E sua presa também se voltara, recebendo a espada de um Duende com a sua própria para lançá-lo ao solo depois com outro movimento de sua mão direita, como se tivesse usado um feitiço de Impulso.

O movimento seguinte de ambos foi se atacarem mutuamente, a lâmina pesada de Sáurio caindo sobre a forma menor e aparentemente mais frágil dela. Apesar da espada menor e aparente fraqueza, no entanto, Christabel conteve seu golpe sem maiores problemas.

_ Percebo que empunha uma espada diferente agora – Sáurio comentou, enquanto as lâminas se continham – O que houve? Sua arma anterior quebrou-se depois do nosso duelo?

Ela obviamente continuava tão impaciente quanto sempre, fosse qual fosse sua arma. Seu próximo movimento foi um chute no ventre desprotegido de Sáurio enquanto as armas se continham, e foi poderoso o bastante para fazê-lo recuar sem fôlego.

Sáurio praguejou entre dentes enquanto ofegava. Ela estava mais forte. No duelo anterior, ela manifestara uma força física capaz de rivalizar com a dele, mas ele podia perceber a inebriante magia ao redor dela oscilar a cada vez que o fazia. Agora, no entanto, não havia oscilação alguma. O poder que sentia emanando dela estava fixo, inabalável. Seus esforços físicos não diminuiam a fonte da força que o atraíra até ali.

Na verdade, Sáurio percebeu de repente, a fonte da força de Christabel não parecia oscilar em nada, e seu olhar mudou um pouco. Não havia qualquer oscilação! A magia de qualquer ser estava sempre em flutuação, quase como se fosse a respiração. Como a dela podia se manter tão...?

_ Sai andando, Calangossauro. Tá enchendo o saco.

Os duelistas se voltaram na direção da voz. Zero estava de pé agora, a espada longa na mão direita voltada para baixo, relaxada, e com a mão esquerda livre, aberta e separada do corpo.

No entanto, a voz e o olhar dele estavam diferentes do costumeiro, e mesmo Sáurio pôde perceber. Quando encontrara aquele humano antes, ele parecia estar se divertindo até enquanto o desafiava. Isso mudara agora. As palavras eram as mesmas, mas o tom e a intenção eram sérias. Mortalmente sérias. Aquela espada relaxada e a atitude dele eram sombrias, e o olhar dele não se desviava de Sáurio. Era como se estivesse marcando o seu alvo, e Sáurio não gostou daquilo.

_ Está se intrometendo novamente no que não lhe diz respeito, seu tolo.

_ O mesmo pra você, otário – Zero retrucou, voltando seu flanco esquerdo para Sáurio – Atrapalhou nossa corrida e capotou minha moto. Some, ou você vai morrer.

_ Idiota! – Sáurio tentou não deixar sua voz revelar que se perturbara, e se aborreceu consigo mesmo por isso – Não se lembra de nosso confronto anterior? Você não foi capaz de vencer uma sexta parte do meu poder!

Zero não respondeu. Por trás dele, um dos Carniçais desceu num mergulho rasante e sua sombra apareceu no solo. Num movimento rápido, Zero saltou para trás e ergueu a lâmina de sua espada, talhando profundamente o pescoço da criatura na passagem e fazendo com que tombasse e se arrastasse pelo solo por alguns metros.

E tornou a olhar para Sáurio. A postura dele estava um pouco diferente, podia atacar tanto à sua protegida quanto a ele, Zero. Tornou a voltar a espada para baixo, parecendo relaxado. Talvez devesse ter imaginado aquilo; o lagarto enfrentara Christabel anteriormente. Ele podia estragar tudo.

_ Tenta a sorte.

Sáurio avançou sobre Zero, sua velocidade realmente muito maior do que se esperaria numa criatura daquele tamanho. O grande lagarto estava nervoso, não tinha como resistir à provocação de Zero.

Mas Zero esperava por isso, também. O falso relaxamento era parte da sua postura, a posição de tiro de um Escavador. A verdadeira ameaça era a pistola recarregada em seu coldre esquerdo, não a espada. Sáurio era um espadachim, e seu primeiro instinto diante de um oponente com uma lâmina era concentrar-se nela. Rápido demais para ser percebido Zero sacou a Marcadora de seu coldre e disparou, atingindo Sáurio com um tiro seco.

A espadachim olhou admirada enquanto o imenso lagarto caía, a espada largada. Fora rápido, muito rápido; ela própria mal conseguira perceber quando a mão de Zero se movera. Não, ele ainda não tinha mostrado o que era realmente capaz de fazer até então. Sáurio não tornaria a se levantar. Estava esperneando no chão, se contorcendo, e ela podia perceber a força da vida dele diminuindo. Mas como...?

_ Se liga, menina, que eles tão vindo!

Ela se aproximou dele com um salto rápido, os dois ficando de costas um para o outro enquanto a forma imensa de Sáurio continuava a se debater em desespero. O vapor amarelado de antes chegou a emanar de seu corpo, uma tentativa desesperada de replicar seu corpo e salvar ao menos sua essência vital, mas era tarde demais.

Seu corpo principal fora atingido, e com ele todo o seu poder. Seu esforço desesperado conseguiu reproduzir novamente o corpo da serpente guerreira, mas era apenas uma casca vazia, sem poder ou espírito. Os poderes e o espírito do grande lagarto tinham sido atingidos, todos ao mesmo tempo que seu corpo físico, já que Zero carregara a Marcadora com quatro das balas de Dragão de Fogo que Dirceu produzira, durante a breve confrontação entre Sáurio e a fugitiva.

Os dois humanos agora lutavam contra adversários que convergiam sobre eles vindos de todas as direções possíveis, atropelando-se e matando uns aos outros em meio aos sons da batalha cada vez mais acirrada entre a hidra e a Serpente de Fogo lá atrás. Zero voltou a lâmina da espada para baixo novamente, e girou para a esquerda para bloquear as garras de outro Lobisomem que lhe saltara em cima.

E no giro, sua pistola ficou em posição para outro tiro certeiro entre os olhos da fera. Sabia das lendas sobre lobisomens, mas tinha fé na criação de seu pai. E o sucesso foi confirmado novamente quando o lobo humano tombou, esperneando como Sáurio fizera, mas mortalmente ferido.

Outro Duende investiu pelo seu flanco. Aprumando o punho da espada na mão, Zero a ergueu apontada para o monstro e o fez empalar-se na lâmina com um tranco.

E um Místico estava mergulhando sobre sua fugitiva, aproveitando sua capacidade de vôo e o fato de que a menina já tinha com o que se preocupar para tentar detê-lo, os braços até estendidos na direção dela.

Zero fez menção de disparar contra a criatura; era sua obrigação manter a retaguarda dela protegida. Mas a espadachim, num movimento rápido de pulso, afastou a foice longa de uma criatura que parecia um gorila imenso de túnica e saltou sobre o ombro dele.

E de lá impulsionou-se para trás, ganhando altura e caindo sobre o Místico que se aproximava, para então se lançar novamente na direção de Zero, forçando o Místico contra o gorila e tirando os dois do combate.

Zero tinha um sorriso feroz no rosto quando ela pousou, já de costas para ele de novo. Tinha se preocupado demais, ao que parecia.

_ E eu pensando que você precisava de ajuda.

_ Ajuda nunca é demais.

O sorriso dele tornou a se alargar. Outro daqueles gorilas estava vindo pela frente. Apesar de continuar com a Marcadora em sua mão esquerda, Zero achou que aquele ali não parecia tão mágico assim, e que talvez fosse melhor guardar a munição especial para um caso de necessidade maior. Tudo isso numa fração de segundo.

No instante seguinte, sua mão guardou a Marcadora e jogou-se para trás, buscando a espingarda às suas costas enquanto ordenava à sua parceira que se afastasse e enquanto ele próprio se atirou para frente, mergulhando por baixo do salto do gorila.

A foice da criatura cravou-se no solo onde os dois humanos tinham estado, e a moça cravara sua katana no solo enquanto se voltava, um arco com duas flechas preparadas em suas mãos. E disparou contra o monstro, atingindo com perfeição uma flecha em cada ombro dele.

O gorila urrou alto, largando a foice em meio à surpresa e à dor. E Zero atrás dele rolara no chão, sacando a espingarda e destravando-a com um movimento brusco do pulso esquerdo.

O som fez com que a fera se voltasse, mas era tarde demais para qualquer coisa. Foi atingido em cheio pelo disparo da arma de Zero, capaz de perfurar e atravessar até paredes de concreto.

Girou e moveu seu pulso de novo, destravando a arma por uma segunda vez. Outro Cascudo estava avançando, saltando sobre ele. Fora rápido, mas sua companheira foi ainda mais veloz, pondo-se diante dele e abatendo o inseto gigante com dois cortes tão rápidos que ele mal os viu, só percebendo os pedaços do Cascudo ao cair.

Colocou-se de pé ao lado dela novamente, os dois dando as costas para uma das escarpas de rocha que havia ali. Estavam se mantendo bem, mas cada ataque chegava mais perto que o anterior. E, ele admitiu para si mesmo com um sorriso esforçado, estava começando a se cansar.

Uma explosão estrondosa atrás de si fez com que alguns dos opositores que se aproximavam caíssem rolando à esquerda e direita deles, e Zero ficou surpreso ao perceber alguns Místicos guinchando de dor enquanto se incendiavam, parecendo que os caídos eram soprados por algum vento poderoso vindo de trás deles. E por toda a volta, uma chuva de fogo começou a cair. Estavam protegidos pela escarpa ao que parecia, mas muitos dos perseguidores à volta não estavam.

_ E agora, o quê...?

_ A Serpente – sua parceira falou à direita – A Serpente de Fogo que nos perseguia... Uma criatura poderosa, um rival à altura para aquela Hidra. Acredito que uma criatura tenha destruído a outra... E, caso seja derrotada, uma Serpente de Fogo pode explodir em chamas dessa forma.

Zero sorriu novamente, olhando para os lados e recarregando às pressas, aproveitando a confusão. E um comentário não podia faltar.

_ Parece que a sorte tá do nosso lado, menina.

_ Sorte é algo caprichoso demais para se confiar nela por tempo demais – lembrou a outra.

_ Verdade – ele riu, nervoso, fechando a espingarda – Mas não vou reclamar dela agora... O que foi?

Sua companheira não respondeu, olhando ao redor. As criaturas à volta tinham sido queimadas pela chuva de fogo, algumas ainda queimando, mas todas se voltavam para a esquerda dele. E Zero também olhou para lá, procurando.

Não estava muito claro a princípio. A planície deserta e barrenta era clara demais naquele horário, mesmo com as nuvens escuras que começavam a se acumular por toda a volta. Mas, ele conseguia ver algo se aproximando.

Num gesto distraído, quase sem reparar que o estava fazendo, sua mão direita procurou algo num dos bolsos de munição às suas costas. Um visor, óculos escuros reformados, que recebera de um velho mendigo quando ainda estava em Melk. O mesmo mendigo que o chamara de ‘mecânico’, e explicara como não tinha morrido ao ser atingido por um relâmpago.

E o visor pareceu clarear sua visão. Se a claridade do vale à sua volta fora substituída pela escuridão das lentes, ao menos agora ele podia divisar algo que antes parecera apenas um borrão na paisagem do horizonte: pontos esverdeados que se aproximavam depressa. Se aproximavam voando, e então ele entendeu o que era.

_ Saco, era só o que me faltava – ele resmungou. Era uma intromissão na escapada, mas a situação não mudava para melhor. Mesmo com o que tinha dito no dia, considerara uma grande sorte não ter tido que enfrentar integralmente aquele tal Arcano quando chegara a Melk. E agora, se seu visor não estava borrado, não era só um que se aproximava.

_ E assim termina a corrida – sua parceira comentou ao seu lado. Sem dúvida ela também sabia o que se aproximava; talvez até pudesse ver melhor que ele, mesmo sem um visor – Alguma idéia?

_ Tenho, sim – Zero voltou-se para ela, o mesmo sorriso cansado no rosto – Vem comigo, precisamos chegar na Unicórnio.

_ Não vamos conseguir fugir deles, mesmo que ela ainda funcione.

_ É, eu sei.